São Paulo, sexta-feira, 17 de janeiro de 1997
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'Dicionário' discute relações amorosas

FERNANDO PAULINO NETO
DA SUCURSAL DO RIO

Especializada em filmes pesados, documentários de curta e média metragens que enfocam extratos marginalizados na sociedade, a cineasta Sandra Werneck, 45, escolheu o bom humor para explorar um tema cotidiano, as relações amorosas, em seu primeiro longa.
Baseado na observação dos relacionamentos de amigos, em sua experiência pessoal -ela estava saindo de um casamento quando teve a idéia- e em autores que falam do amor, como Stendhal e Roland Barthes, ela realizou o "Pequeno Dicionário Amoroso".
O filme estréia hoje em oito cinemas do Rio com uma elogiosa propaganda boca-a-boca de quem viu a série de pré-estréias realizadas pela cidade. Em São Paulo, a produção, que entra em cartaz no dia 31, tem pré-estréia amanhã, às 21h50, na sala 4 do Espaço Unibanco de Cinema.
"A história é corriqueira. O que dá o tom original é a estrutura", diz Sandra.
Entre seus 12 trabalhos anteriores destacam-se "Pena Prisão", documentário sobre um presídio feminino, "Damas da Noite", documentário e ficção sobre prostituição, e "A Guerra dos Meninos", sobre meninos de rua, baseado em livro homônimo do jornalista Gilberto Dimenstein, colunista da Folha.
Uma das inspirações de "Pequeno Dicionário Amoroso" é o livro "Fragmentos do Discurso Amoroso", de Barthes. Sandra escolheu uma palavra-chave das relações amorosas para cada letra do alfabeto e, a partir dela, conta sua história em episódios estanques que se interligam para formar a narrativa global.
"Foi complicado de fazer", disse Sandra. Ela lembra, por exemplo, a letra "C". A palavra escolhida seria "cumplicidade", mas, no início do filme, o casal, vivido por Andréa Beltrão e Daniel Dantas, ainda não a tinha.
A palavra escolhida, então, foi "coincidências". É o casal, no primeiro jantar, descobrindo tudo o que tem em comum.
O problema se repetiu no "T". A palavra seria "tesão", mas o relacionamento já estava no fim. Foi escolhida "tormenta". "Foi um quebra-cabeça para montar."
Daniel Dantas, 42, que representa o biólogo Gabriel, diz que quem viu o filme "se identifica com vários momentos". Para ele, as pessoas "riem porque aquilo dói nelas".
Sandra renega o filme como uma comédia. "Ninguém cai, derrama café. É um humor racional e sofisticado. É um humor que às vezes vem da tragédia", diz.
O produtor Bruno Wainer, 36, da Lumière, distribuidora e sócia do filme, com 33% das cotas, compara a narrativa aos filmes de Arnaldo Jabor (como "Eu te Amo" e "Eu Sei que Vou te Amar") e às comédias de relacionamento humano de Woody Allen.
"Estou falando da temática de desencontro de casais, da discussão sobre o amor, casamento e crise, sem entrar no mérito da forma e do nível artístico que não tem nada a ver", disse Wainer.
Ele é, juntamente com Sandra Werneck (com outros 33%), o sócio majoritário do filme. Os outros acionistas são o consórcio Europa-Severiano Ribeiro (20%), Shell (12,5%) e Mobile Light (1,5%). O filme custou R$ 1 milhão.
Locado no Rio por uma diretora que mora na cidade, "Pequeno Dicionário Amoroso", na opinião de Wainer, não é um filme carioca. "Poderia ter sido filmado em São Paulo ou qualquer outra cidade grande." Trata-se de uma "comédia urbana".
Wainer diz que "é fogo" vender um filme brasileiro. Seu desafio é "dar uma carreira digna" para a obra de Sandra Werneck. Antes mesmo de estrear no Brasil, ele já foi negociado para México, Espanha e França, garantindo um faturamento de US$ 200 mil, ou 20% de seu custo total.
"O que torna o filme vendável é a identificação da classe média-baixa até a classe média-alta com a temática", diz Wainer, repetindo o "slogan" criado para o lançamento: "Não case nem separe antes de ver o filme".
Para a diretora, as situações vividas pelos personagens repetem as da vida real. "Os casais saem do filme com vontade de falar. Os que estão bem vão achar graça. Os que estão mal vão conversar."

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