São Paulo, sábado, 18 de janeiro de 1997
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A Vale do Rio Doce (2)

LUCIANO MENDES DE ALMEIDA

Novos dados e reflexões permitem compreender melhor as diferentes posições a respeito da proposta de privatização da Companhia Vale do Rio Doce, composta de mais de 60 empresas que operam, de modo integrado, nos mais variados setores da economia nacional.
1) Há os que defendem a imediata privatização, fundados na tese de que não compete ao Estado administrar diretamente a exploração do subsolo e que deveria voltar-se para áreas mais condizentes com sua missão, como saúde, educação e justiça. O resultado da venda da CVRD seria usado para pagar juros da dívida externa ou, ainda, para beneficiar projetos de desenvolvimento, dando prioridade aos Estados da União em que a Vale atua.
Alegam alguns que a decisão não deveria tardar, considerando a Vale pouco rentável, quando comparada a empresas semelhantes de outros países.
2) Os que se opõem à privatização da CVRD acham que constitui um caso particular a ser poupado no quadro das privatizações, em especial porque atua no setor de mineração de preciosas jazidas das quais depende, em grande parte, a riqueza do país e a estratégia de seu futuro desenvolvimento. Consideram a CVRD instrumento indispensável para dar ao Brasil condições privilegiadas de interação no mercado internacional, vencendo a posição de subserviência que poderia derivar da venda da CVRD a grupos estrangeiros. Em relação ao papel do Estado, consideram que, em área de tanto interesse para a independência científica e econômica do país, não poderia haver lugar para a privatização.
3) Há uma série de ponderações de bom senso que ajudam para um adequado discernimento. Assim, por exemplo, nada impede que haja contratos de gestão de empresas ou de setores, sem perder a unidade da Companhia. Poderia ser agilizado o processo de decisões, hoje lento, por causa da demasiada burocratização de empresas estatais.
4) Em relação a uma precipitada definição sobre a privatização da CVRD nos próximos meses, temos que afastá-la, à luz de algumas premissas ditadas por evidente prudência e suas consequências éticas:
a) não é possível privatizar a CVRD sem a correta avaliação de seu patrimônio. No momento é desconhecida a verdadeira riqueza de suas jazidas e seu potencial futuro; b) não é razoável tomar uma decisão sem o relativo consenso dos técnicos de renome no país; c) não convém dispor do subsolo nacional sem uma ampla consulta e debate no Congresso e, se possível, em nossas áreas universitárias e empresariais; d) será necessário para isso divulgar dados exatos e as realizações da CVRD, corrigindo deturpações que circularam, por exemplo, sobre o pouco rendimento da Companhia.
5) Está em questão o bem comum. É preciso exercitar a cidadania e a responsabilidade política do cristão. Creio que a melhor opção, prudente e serena, é a de renunciar, de modo convicto, à tentação de sacrificar a Vale em vista de benefícios efêmeros e discutíveis.
Procuremos, governo e sociedade, sim, aperfeiçoá-la com base no princípio que nos leva a salvaguardar a soberania e o futuro desenvolvimento nacional. Incentivemos os atuais dirigentes e funcionários da CVRD a continuar o excelente serviço científico, econômico e social que, com devotamento e competência, prestam ao Brasil.

D. Luciano Mendes de Almeida escreve aos sábados nesta coluna.

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