São Paulo, domingo, 19 de janeiro de 1997
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Saúde pública ignora doença hereditária mais comum no Brasil

VANESSA DE SÁ; VINICIUS TORRES FREIRE
DA REPORTAGEM LOCAL

Em 1997, cerca de 2.000 crianças vão nascer com anemia falciforme no Brasil. O mal é incurável e hereditário. Se a doença é detectada no bebê recém-nascido, a terapia existente pode fazer com que o adulto leve uma vida longa e quase normal. Mas no Brasil não há um programa de testes de rotina.
O exame custa R$ 1,00. Nos EUA, onde há testes em massa, os doentes vivem em média 57 anos. A expectativa de vida dos falcêmicos é de 16 a 30 anos no Brasil. A anemia falciforme é a doença hereditária mais comum dos brasileiros.
Os doentes podem morrer de infecções e por causa do mau funcionamento dos órgãos, provocado pelo entupimento dos vasos sanguíneos (veja quadro ao lado).
A anemia falciforme afeta majoritariamente pessoas de origem negra, com menor incidência em italianos, árabes e turcos.
O mal atinge 1 bebê em cada 1.000 que nascem no Brasil. É dez vezes mais comum do que a fenilcetonúria, detectada pelo "teste do pezinho" (leia texto abaixo).
O primeiro programa público de combate à doença foi entregue em agosto de 96 ao Ministério da Saúde. Os primeiros resultados práticos -distribuição de remédios pelo SUS para parte dos doentes- vão começar a aparecer apenas no primeiro semestre de 97.
"Falta um programa público por um problema econômico e cultural. A doença afeta a população mais pobre, que tem pouca informação para se organizar e reivindicar melhor tratamento", diz Sérgio Ramalho, professor titular de genética médica da Universidade Estadual de Campinas e especialista na doença. Em Campinas, uma lei municipal obriga que os recém-nascidos sejam testados.
"Não há política pública voltada ao aconselhamento genético de casais, tratamento e diagnóstico da doença", afirma Berenice Kikushi, que pesquisa o problema do atendimento dos falcêmicos com bolsa da Fundação MacCarthur (EUA).
"Para falar francamente: não há política pública porque a doença afeta pessoas de origem negra e, portanto, mais pobres, na maioria", diz Mara Hutz, professora do departamento de genética médica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Em 1981, uma pesquisa de Hutz mostrava que a expectativa de vida média dos falcêmicos no país era de 16 anos (podendo variar de 4 a 28 anos). Ela estudou 20 anos de registros sobre falcêmicos do Instituto Estadual de Imunologia do Rio de Janeiro, Estado onde as condições de tratamento são melhores do que as da média do país. Hutz não atualizou seus dados, mas acredita que a situação tenha melhorado pouco.

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