São Paulo, domingo, 26 de janeiro de 1997
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Veto ao segundo mandato é uma constante na história republicana

JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

Nenhuma das constituições brasileiras permitiu a reeleição do presidente da República.
"Nunca houve uma dimensão institucional nas ocasiões em que se discutiu o problema. A discussão se personalizava. Argumentava-se sobre as lideranças que poderiam circunstancialmente se beneficiar com a reeleição."
É o que diz Maria Celina Araújo, professora da UFF (Universidade Federal Fluminense) e pesquisadora do CPDoc (Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil), da Fundação Getúlio Vargas.
Ela cita os exemplos de 1934 e 1946. No primeiro caso, Getúlio Vargas, já presidente constitucional, estava impedido de concorrer na eleição presidencial marcada para o início de 1938.
Seus diários, publicados no ano passado, revelam que desde abril de 1937 ele já trazia no bolso o projeto da ditadura do Estado Novo.
Daria o golpe em novembro daquele ano, deixando ao relento os dois candidatos -Armando de Sales Oliveira e José Américo de Almeida- em campanha para sucedê-lo no Catete.
O mesmo Vargas serviria de pretexto para que a Constituição de 1946 vetasse a reeleição. Ele não poderia concorrer às presidenciais daquele ano. Mas concorreu -e ganhou- em 1950.
O mais virulento dos líderes da oposição, Carlos Lacerda (UDN), entrou com recurso no Supremo para impedir sua posse do presidente eleito. O recurso foi indeferido porque fora Eurico Dutra, e não Vargas, o ocupante imediatamente anterior da chefia do Estado.
Em 1891, quando da primeira Constituição republicana, é comum mencionar como consensual o temor dos constituintes de que um presidente reeleito se eternizasse no poder e se tornasse um virtual "imperador".
Mas os debates foram bem mais complexos, diz o historiador José Murilo de Carvalho, do Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisa do Rio de Janeiro).
"A questão da democracia não era sequer levantada. O problema estava em garantir a alternância de poder entre setores das elites, mecanismo que, durante o Império, era assegurado pelo Poder Moderador", diz ele.
"O modelo presidencialista adotado foi o defendido pelo PRP (republicanos paulistas) e pelos militares, adeptos de um poder mais centralizado", diz o historiador.
Em simpósio realizado em 1992 pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), a cientista política Maria Tereza Sadek dizia que, na América Latina, é recorrente a preocupação com a limitação do poder presidencial.
Naquele momento, só o Paraguai e a República Dominicana seguiam o exemplo dos Estados Unidos, que permitem a reeleição. A Argentina e o Peru adotaram a seguir o mesmo modelo.
Entre 1987 e 1988, diz o cientista político Bolivar Lamounier, o tema da reeleição foi eclipsado, no debate constituinte, pela adoção ou não do parlamentarismo.
Em 1967, a Constituição do regime militar manteve o veto. Mas era uma maneira de assegurar a alternância do poder. Ou seja, impedir que o continuísmo se tornasse o projeto de uma das facções das Forças Armadas.

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