São Paulo, quarta-feira, 15 de outubro de 1997
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Visitas e visitas

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Alguma coisa deve mudar no cerimonial das visitas oficiais dos presidentes de outros países. Uma coisa é receber o chefe de uma nação, outra o chefe de um governo. Quando as duas funções se misturam, como no caso de Clinton, e especialmente no caso dele, fica difícil expressar o carinho de povos que se respeitam ou se afinam em objetivos nacionais.
Clinton não veio ao Brasil representando o povo americano, a pipoca, o marinheiro Popeye, o camundongo Mickey, a música de Cole Porter, as bandas de Nova Orleans, a Golden Gate, a dupla Fred Astaire-Ginger Rogers dançando "Cheek to Cheek". Veio em nome de interesses específicos, comerciais, dentro de uma estratégia em que o mais forte sente necessidade de impor sua vontade ao mais fraco para ficar mais forte ainda.
Daí que é difícil, para não dizer que se torna cretino, recebê-lo com fanfarras e júbilo. A maior parte da população nem sabe exatamente o que acontece nessas conversas e o que fica estabelecido nos protocolos disso e daquilo que são assinados. Os que sabem, reclamam. É quase um ato de guerra, de rendição.
Além disso, essas visitas dão um trabalhão e uma despesa, tanto ao presidente que visita quanto ao presidente visitado. Seria mais moderno, mais "mercado" se fossem eventos separados. É o que acontece, mais ou menos, quando morre o líder importante de um país e em torno de seu ataúde todos os grandes se reúnem por algumas horas, expressando um pesar mundial.
Lembro os enterros de Churchill, John Kennedy, De Gaulle e João 23. Podia lembrar também a conferência Rio 92, quando mais de cem chefes de governo vieram ao Brasil num único e desperdiçado propósito.
Fora disso, o que essas visitas oficiais representam é uma pressão, às vezes tão óbvia que pode ser confundida com chantagem. Todos sabemos que é nessa categoria que a atual visita de Clinton deve ser enquadrada.

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