São Paulo, domingo, 19 de outubro de 1997
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Expansão financeira global está perdendo vigor

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

O presidente do banco central dos EUA, Alan Greenspan, deu novamente o alerta. A expansão nas Bolsas não tem como prosseguir nesse ritmo. Na Alemanha, o Bundesbank (banco central) imediatamente elevou as taxas de juros, sendo seguido no ato pelos outros bancos centrais europeus. O cenário internacional está mudando. Para emergentes em geral, a hora é de alerta e cautela.
A advertência foi dada na última sexta-feira, em seminário sobre cenários para 1998 da Câmara Americana de Comércio de São Paulo. José Carlos Carvalho, economista do Banco Pactual, afirma que os ventos estão mudando, ainda que de modo lento e gradual.
Elena Landau, ex-cabeça da privatização brasileira, fez outro lembrete incômodo no seminário.
Ela disse que é preciso temperar o entusiasmo com a privatização brasileira. Afinal, privatizações e aquisições têm ocorrido alavancadas por empréstimos externos e alguns compradores têm pressa em remeter lucros e dividendos.
Francisco Gros, ex-presidente do BC, agora com o Morgan Stanley em Nova York, pintou um quadro róseo, mas no final acabou fazendo eco às advertências do Greenspan. E "tranquilizou" os presentes: se o caldo entornar, virá uma recessão, não uma máxi.
O ING Barings acaba de publicar em Londres o seu relatório "Global Economics", relativo ao quarto trimestre de 1997, destacando a desaceleração no crescimento da liquidez financeira internacional.
A liquidez global cresce agora a meros 5,4% (dado de agosto, contra o mesmo mês do ano passado). Em janeiro, a taxa era de 12% e em janeiro de 96 era de 15,6%.
A restrição monetária tem um lado bom. Se ela de fato impedir o surgimento de pressões inflacionárias, o Fed (banco central dos EUA) não precisará recorrer a altas fortes dos juros. Mas isso pode ocorrer com valorização do dólar, queda no preço das commodities (que países como o Brasil exportam) e redução do crescimento.
Otimismo e cautela
O ING Barings é otimista e aposta nos efeitos benéficos da inflação baixa com crescimento moderado. Mas assume um tom cético quando fala do Brasil, onde "os riscos são óbvios". Mas os fluxos de capitais externos devem bastar para segurar o real "até depois das eleições do ano que vem". A análise fala ainda em "situação delicada" nas contas externas e calcula um atraso cambial no Brasil de 20%.
Ninguém acredita em crise. O governo brasileiro pode subir os juros, apertar o crédito, produzir uma recessão, queimar reservas antes que o câmbio saia do lugar. Mas José Carlos Carvalho, do Pactual, lembra que o risco maior não é de "ataque especulativo". O problema, diz, é que o Brasil tem hoje uma necessidade de financiamento de US$ 60 bilhões ao ano. O risco não é só a reação dos especuladores, mas a dependência externa.
Mudanças nos juros, na liquidez global ou na padrão de remessa de lucros, fatos normais e recorrentes, seriam suficientes para provocar uma perda rápida de reservas.
Aliás, talvez seja ainda mais importante notar que nenhum desses analistas torce contra a estabilização brasileira ou joga no time dos catastrofistas. Tratam apenas de observar pequenas mudanças no cenário financeiro global que, como no caos matemático, podem deflagrar grandes transformações.

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