São Paulo, domingo, 19 de outubro de 1997
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Organizadas são a fúria dos novos tempos

ALBERTO HELENA JR.
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

A emboscada ao ônibus da delegação do Corinthians, na estrada de Santos, é mais um caso de polícia e, como tal, deveria ser tratado lá nas páginas policiais. Mas há alguns signos, nesse episódio, que merecem interpretação.
Por exemplo: quando surgiram as primeiras torcidas padronizadas no futebol paulista, lá pelos anos 30/40, elas logo se autodenominaram torcidas uniformizadas, e assim foram tratadas até os anos 70, quando passaram a ser chamadas de torcidas organizadas. Parece uma simples troca de palavras, mas vai além. Se as palavras servem para designar a essência das coisas, as torcidas uniformizadas eram essencialmente visuais, coreográficas, cromáticas. Buscavam, talvez inconscientemente, cobrir o cinzento das arquibancadas com o jogo de cores e emoção que se desenrolava lá embaixo, sobre o campo verde.
O som que animava essa festa multicor era uma pequena brejeirice, de um "non-sense" lamartinesco ou babeano, como queiram, que partia do francês "Allez!" (Avante!) para formar os nossos aleguás-guás-guás. Era um pouco de Chevallier interpretando marchinhas de Lamartine, num musical de Mickey Rooney, sob o clima de Corso de Carnaval na avenida Paulista.
Quando passaram a ser conhecidas como torcidas organizadas, houve um toque tecno, um som estridente de guitarra rebelde, que rapidamente se transformou num baile funk de periferia, e os cânticos de incentivo se transformaram em gritos de guerra, rapes chulos e primais, que encheram o ar de tensão e irracionalidade.
E Metaleiro é o líder dessas gangues que se abrigam sob a bandeira dos Gaviões da Fiel, onde não há espaço para a cor-de-rosa. Só preto ou branco, amigo ou inimigo, sim ou não, submissão ou porrada, o branco da rendição ou o vermelho do sangue tingindo o cinzento das arquibancadas, das ruas, das estradas.
É James Dean, o paradigma hollywoodiano dos conflitos emocionais, levado ao paroxismo de um só sentimento corporativizado: o ódio ao que não é estritamente igual. É o negro fascismo na sua forma mais primitiva.
Pois essa é a cor da fúria. E o som dos novos tempos.
*
Nesta tarde, contra o Coritiba, estréia Márcio Santos no tricolor. Não sei como anda o craque das pernas. Mesmo porque, desde a grave contusão que sofreu, pela seleção, há mais de ano, Márcio só conseguiu jogar significativa sequência de jogos pelo Atlético-MG, na temporada passada. Logo, não se pode exigir muito do becão.
Estou mesmo de olho é na dupla de meias desse time que começa jogando hoje: Silas, pela direita; Denílson, pela esquerda. Na teoria, a perfeita combinação de estilos. Denílson, a inspiração pura, o drible surpreendente, as arrancadas incontroláveis, a invenção. Silas, a sabedoria de quem domina o tempo e os espaços do campo como poucos, o passe preciso, a colocação.
Vejamos tudo isso na prática como será.

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