São Paulo, domingo, 19 de outubro de 1997
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A operação 'tapa-olhos'

ELISEU PADILHA

Hoje, as 60 principais rodovias federais brasileiras estão em obras. São estradas construídas, em sua maioria, nos anos 70; ajudaram a integrar o país.
Mas rodovias não duram para sempre -em média, 15 anos, se tiverem manutenção preventiva. Nas duas últimas décadas, o Estado foi negligente. Dos 2% do PIB investidos nos anos 70, tempos do Fundo Rodoviário Nacional, extinto em 88, hoje investimos 0,15%.
O resultado todos sabem: uma malha rodoviária pavimentada de 51 mil km, de valor incalculável, estava sendo destruída pela ação do tempo e por nossa omissão como administradores.
Digo "estava" porque o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso está restaurando 14 mil km de estradas totalmente danificadas, em que o asfalto acabou, submetendo o motorista a um risco constante e encarecendo o frete das cargas transportadas.
A restauração desses trechos -incluídos no Projeto de Recuperação e Descentralização de Rodovias do programa "Brasil em Ação"- levará quatro anos e custará US$ 1,25 bilhão. Será financiada pelo Bird, pelo BID e pelo Orçamento da União. Além disso, serão investidos mais R$ 3,52 bilhões na construção de quatro grandes obras rodoviárias previstas no programa.
É muito chão. Trata-se da duplicação e da modernização da Fernão Dias, entre Belo Horizonte e São Paulo; da pavimentação da BR-174, entre Manaus e a fronteira Brasil-Venezuela; da recuperação das BRs 364 e 163, que vai melhorar o transporte da soja produzida na chapada dos Parecis; da duplicação e da modernização da rodovia do Mercosul (BRs 101, 116 e 376), que ampliarão o comércio com países vizinhos e tornarão mais rápido o acesso a importantes portos. O governo concedeu 856 km de rodovias ao setor privado, planeja conceder outros 7.000 e vai transferir mais 13 mil, em boas condições, aos Estados.
Ainda assim, cerca de 28 mil km precisavam de intervenção imediata. São estradas nas quais ainda se pode trabalhar com pouco dinheiro, recuperando a camada superior de asfalto. É o que se chama operação "tapa-buracos", iniciada pelo DNER em agosto, depois de anunciada pelo presidente, em seu programa de rádio, em 16 de junho. Ela custará R$ 270 milhões. Entre nós, do governo, não há ilusão. Nosso objetivo é melhorar um pouco a difícil vida de quem depende das estradas.
Apesar de fazer a distinção clara entre restauração e operação "tapa-buracos", o presidente, que fora municiado por mim, vem sendo mal interpretado. Cobra-se que em 120 dias as estradas do país estejam em ótimo estado. Há até quem inclua rodovias estaduais na lista das "prometidas" pela operação.
A Folha, em 12/10, citou duas rodovias como exemplos de "descumprimento". Uma delas, a Régis Bittencourt, entre São Paulo e Curitiba, está sendo duplicada e modernizada e será entregue ao tráfego no segundo semestre de 98. Seria criminoso remendar parcialmente uma estrada, desfazer o remendo e, meses depois, restaurá-la.
A outra é a Fernão Dias, em processo de duplicação e modernização, obra financiada por Ministério dos Transportes, BID e governos de Minas e São Paulo ao custo de US$ 1,084 bilhão, a ser concluída em dezembro de 98.
O governo se empenha em mudar uma situação de descaso nas rodovias. Tem um programa e a consciência de que terá que se preocupar com a manutenção. O tempo nos mostrará que só não viajará em estradas melhores quem não andar por aí e, desinformado, dê corpo a uma operação "tapa-olhos".

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