São Paulo, terça-feira, 11 de novembro de 1997
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Leia abaixo o pronunciamento do presidente FHC

Leia a seguir a íntegra do pronunciamento do presidente Fernando Henrique Cardoso sobre as medidas econômicas.
Hoje, as medidas anunciadas pelo governo foram medidas duras e eu tomei essas medidas, autorizei essas medidas. Porque eu estou com a absoluta certeza de que elas são essenciais, são fundamentais para o país, para o Brasil. Acredito que nós não poderíamos incorrer em erro nem de omissão nem de dúvidas, no momento em que em alguns outros países, como se viu na Ásia, houve desvalorização de 40%, que traz a inflação de volta e que tira o salário do bolso do trabalhador, do bolso daquele que está nos bancos, dos funcionários públicos, da classe média. Tínhamos que agir com clareza e com determinação. Como fizemos.
Nenhuma das medidas tem por objetivo esconder o que quer que seja. Nem são medidas que visam confiscar poupança, criar situações de desrespeito a direitos estabelecidos. Pelo contrário, são medidas absolutamente claras no seu alcance. Por certo, elas podem acarretar impopularidade do presidente, mas o presidente não está preocupado, neste momento, senão com o Brasil e com o povo do Brasil.
Aqueles que olharem com mais atenção ao que nós fizemos, verão que nós fizemos o que era necessário para reganhar confiança. Sem confiança nos mercados nacionais e internacionais -e eles são ligados- não haveria condições de nós seguirmos adiante no grande programa, que é o nosso programa de retomada do crescimento em bases sólidas de continuidade de uma série de transformações que estão beneficiando o povo. E o povo é o primeiro a saber que sem o real, sem moeda forte, estável, a inflação é o pior imposto.
Essas medidas visam impedir a volta da inflação, que haja perda de confiança dos mercados no real. E, ao tomá-las, também nós cuidamos para que áreas fundamentais não fossem atingidas: educação, saúde, assistência social, reforma agrária foram poupadas completamente de quaisquer medidas mais restritivas.
Por outro lado, não é preciso temer qualquer abalo na cesta básica. Aquilo que conta para o povo, que é a comida, que é o valor do seu trabalho, não será alcançado, não será afetado por essas medidas.
Alguns dirão que é possível que com um pequeno aumento na gasolina haja aumento no custo de vida. A Fipe, que é da Universidade de São Paulo, já calculou em 0,21%, ou seja, praticamente nada, a incidência desse pequeno ajuste sobre a inflação no primeiro mês. De modo que é preciso já desde logo afastar qualquer hipótese no sentido de que nós possamos com isso acarretar a volta da inflação. A inflação não voltará na medida em que o real se mantiver forte.
E o Brasil não é um mercado, então hoje é o conjunto do Brasil: é o governo, é o Congresso, é a população que percebeu que tem que lutar pela manutenção das nossas possibilidades de continuidade de crescimento e, portanto, da defesa do real. É claro, alguns setores da população pagarão um certo preço, mas apenas 8% da população brasileira paga Imposto de Renda, 8% da população brasileira. E, ainda assim, há um cuidado com esses 8%, a classe média já tem sofrido muito e nós não podemos deixar de dar atenção às agruras da classe média.
Nós vamos mudar, como já foi dito, o Imposto de Renda das pessoas jurídicas, mas nós também criamos condições para o setor exportador continuar crescendo. Há várias medidas, eu não preciso detalhá-las porque os técnicos já o fizeram, mas há várias medidas de apoio à continuidade do processo de exportação no Brasil.
Por outro lado, nós também tomamos medidas que são moralizadoras. Alguns poderão perguntar, por exemplo, no que diz respeito à existência de funcionários aposentados que não se recadastraram, por que não se fez isso antes?
Porque o Brasil era um país bastante desorganizado e foi preciso um esforço grande de reorganização e nós fizemos um contrato com o Banco do Brasil e nunca tinha sido feito um cadastramento dos funcionários em inatividade. Já havia dos que estão em atividade e, para a nossa surpresa, passava de cem mil o número dos que não se apresentaram nesse recadastramento. Estamos fazendo uma verificação para avaliar quantos são e, certamente, depois de um aviso no contracheque, aqueles que não se recadastrarem, nós suspenderemos seus pagamentos porque eles são ilícitos.
Da mesma maneira como nós vamos continuar a combater o superfaturamento no comércio exterior, o combate à lavagem do dinheiro -as medidas estão no Congresso-, nós estamos atuando com mais energia para isso. Da mesma maneira como nós temos medida para garantir a recuperação dos créditos tributários.
De modo que é um conjunto de medidas. Não se trata apenas de uma medida. Não visa recair sobre um setor especial, visa, sim, evitar que os setores que mais necessitam sejam atingidos. E eu já disse que a inflação não volta, que a cesta básica se mantém sem ser abalada por essas medidas e que nós faremos tudo para acontecer aquilo que nós desejamos. Se nós desejamos a queda na taxa de juros, que subiu em função do descrédito dos títulos da dívida no exterior e da valorização maior das aplicações fora do que aqui. Por isso é que nós tivemos que aumentar as taxas de juros. Com essas medidas, na medida em que nós também ganhamos outra vez a confiança no país, nós voltaremos a baixar a taxa de juros. E isso mostra que nós vamos manter a mesma política.
A política do Brasil é uma política que não vai mudar ao sabor de alguma modificação momentânea de estado de espírito em relação ao país. Há condição para nós demonstrarmos, como nós estamos demonstrando, decisão, capacidade de agir no momento oportuno e enfrentar os problemas pela raiz e enfrentar pela raiz é restabelecer condições de que o déficit fiscal não seja um peso insuportável.
Devo dizer que o déficit fiscal que eu recebi quando assumi o governo era de quase 5% do PIB, e que nós já passamos esse déficit ao redor de 3% do PIB. Portanto, nós não deixamos de fazer o que tínhamos que fazer. Apenas, como mudou a atmosfera no mundo em função da crise asiática, nós temos que fazer mais depressa aquilo que nós estávamos fazendo numa trajetória mais longa.
Da mesma forma no que diz respeito às contas externas do Brasil, às contas correntes do Brasil. Todas as medidas são claramente indicadores de que nós vamos ter um desempenho mais favorável na nossa balança de contas correntes e, por outro lado, que a balança comercial vai melhorar porque nós estamos tomando medidas que favorecem os exportadores, as exportações, e porque nós também estamos prevendo menor demanda nas importações, coisa que já estava ocorrendo e o mês de outubro tinha mostrado isso. E quanto às previsões dos pessimistas de que nós iríamos ter no fim do ano um déficit de conta corrente de até US$ 15 bilhões, se mostra insubsistente porque, no máximo, vamos chegar entre US$ 9 bilhões ou US$ 10 bilhões, no máximo possível porque é até ao redor de US$ 9 bilhões, mais do que de US$ 10 bilhões. E o ano de 98, com essas medidas todas, nós vamos ter um desempenho da nossa balança comercial ainda mais expressivo e ainda melhor.
Portanto, nós estamos aprofundando aquilo que estávamos fazendo e acelerando algumas diretrizes de política por causa do clima que se criou, a partir da crise asiática, mas com isso nós vamos continuar o nosso programa de privatização. Nós vamos aumentar o nosso cacife em termos dos recursos disponíveis -e nós temos vários-, já alguns dos nossos técnicos estão trabalhando em áreas para mostrar como nós podemos transformar em recursos vivos aquilo que nós temos em termos de petróleo, em termos de recebíveis, ou seja, de dívidas que podem ser securitizadas do setor elétrico.
O país tem muitos recursos e o governo, tendo a disposição que tem para enfrentar as adversidades com competência e com coragem, e também com tranquilidade, sabendo que o mais importante de tudo é que a população acompanhe, que a população saiba, entenda que o esforço feito é um esforço que é feito para salvaguardar o que é essencial, que é a estabilidade da moeda e da vida. Não voltar a inflação e criar condições para que o crescimento possa ser retomado, e acho que é prematuro fazer previsões sobre taxas de crescimento no ano que vem, porque eu acho que o Brasil é um país que desmoraliza os pessimistas.
O pessimista, já dizia o presidente Kubitschek, erra no ponto de partida porque frequentemente a previsão está aquém do que vai acontecer. O otimista, pelo menos, está mais afim com o sentimento do povo e com a vontade que nós temos de continuar mantendo o Brasil -como continuaremos- um país democrático, decente para o seu povo e um país que tem um governo que fala ao país, que não tem o que esconder e o povo é testemunha de que o presidente e o governo, nós estamos empenhados numa batalha dura. Precisamos e temos tido o apoio do Congresso. As reformas precisam continuar. Tivéssemos já as reformas e talvez não precisássemos hoje de medidas tão duras. Continuaremos a luta por elas, continuaremos a privatização, continuaremos atuando em todos os campos e com a confiança que em mim não vai faltar nunca no meu país.
É o que eu queria dizer e agradeço a vocês. Muito obrigado.

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