São Paulo, quinta-feira, 13 de novembro de 1997
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Imposto de Renda e o grande debate nacional

ALOYSIO BIONDI

A grande crise está aí, é hora de reflexão. Ameaça ao país: já começou o blablablá aparentemente "patriótico", de que é hora de união nacional, é preciso aprovar tudo o que o governo quer e "et cetera" e tal. Ora bolas, nos últimos três anos houve unanimidade cega, "carta branca total" ao presidente Fernando Henrique e sua equipe, por parte de formadores de opinião -de jornalistas e líderes empresariais.
Por isso mesmo, por causa dessa "lavagem cerebral", a opinião pública assistiu, inerte, o país caminhar para o desastre. Não. Não é hora de "unanimidade" burra, mais. É hora de debater. Questionar. Fazer análises corretas, utilizando estatísticas. Informar a sociedade. E, principalmente, abrir espaço para as vozes discordantes: nos últimos três anos, elas foram expulsas dos meios de comunicação.
Um exemplo ilustrativo? Todas as vezes em que a oposição conseguiu convocar um ministro ou um presidente ou diretor do Banco Central para depor, o que aconteceu? Os meios de comunicação repetiram a rotina: publicaram ou divulgaram páginas inteiras com as explicações das "autoridades". Perguntas feitas por deputados ou senadores, questionando as versões oficiais? Nem uma linha. Espaço, só para os porta-vozes de Brasília.
Assim a sociedade foi engabelada. Assim o país caminhou para o desastre. Assim se deu a impressão de que a oposição, os críticos, não tinham nada a dizer. E a equipe FHC reinou, absoluta, cometendo os maiores disparates. Isso continua a acontecer, neste momento de "pacotes".
Dólares e IR
Engraçado, se não fosse trágico -já que a sociedade vai pagar o preço da crise. Agora, da noite para o dia, surgem banqueiros, analistas, economistas, dizendo que o Brasil precisa de algo como US$ 60 bilhões em 1998. Metade para cobrir o rombo do próprio ano. Metade para renovar empréstimos dos mais diversos tipos, tomados no exterior pelo governo ou empresas privadas (crédito para importar, crédito para exportar, crédito para especular no mercado financeiro).
É cômico comparar as análises "especializadas" de agora, depois da crise, e as análises dias antes da crise. Dizia-se que estava tudo "cor-de-rosa". Tudo ótimo. Uai. Esses analistas não viam, todos os meses, todos os dias, estatísticas mostrando o buraco em que o Brasil estava se enfiando? Só agora descobriram o "rombo" de US$ 60 bilhões? Isso é análise econômica? Ou religião dos adoradores irracionais da equipe FHC?
Do "pacote", o ponto que provocou indignação foi a elevação do Imposto de Renda. Não é descabida a suposição de que essa medida foi planejada exatamente para isso: provocar revolta, e ser então maquiavelicamente "trocada" pelo aumento da CPMF. A "troca" não deve ser aceita. Dentro de um verdadeiro debate, surgirá outra saída, totalmente diferente: é preciso aproveitar o "pacote" para mudar a vergonhosa política de cobrança do Imposto de Renda implantada no país pela equipe FHC, sem um tugido nem mugido da opinião pública. O presidente FHC fez uma reforma tributária às avessas.
Com a aprovação do Congresso, reduziu as alíquotas para os ricos e riquíssimos, e aumentou para a classe média e os mais pobres. Deixou apenas duas alíquotas: ou o brasileiro paga 15%, ou paga 25%. Como esta Folha mostrou ainda ontem, o Imposto de Renda é realmente progressivo, isto é, cobra-se mais de quem tem rendimentos maiores, no mundo todo. Chile? Até 45%. México? Até 35%. EUA? Até 40%. Coréia? Até 45%. Inglaterra? Até 45%.
O Congresso deve aproveitar o "pacote" para rediscutir a vergonhosa política fiscal brasileira. Começar a corrigir as monstruosidades da equipe FHC. Basta olhar o exemplo externo.
A saída?
O Japão, para impedir que as importações destruam empresas e empregos locais, cobra imposto de 16% para a maioria dos produtos estrangeiros ("tarifa modal", dizem os especialistas). A Coréia do Sul, 23%. No Brasil, a tarifa ou imposto que recai sobre a maioria dos produtos (tarifa modal) é de zero. Obra incrível da equipe FHC, e não do ex-ministro Ciro Gomes ou do governo Collor. O "pacote" não mexeu nas tarifas. Manteve o mercado escancarado. Por isso mesmo, o rombo continuará, a crise avançará. O resto é blablablá.

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