São Paulo, sexta-feira, 14 de novembro de 1997
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Schrader prova talento

LÚCIA NAGIB
DA ENVIADA ESPECIAL

Um dos filmes mais importantes até agora, dentre os apresentados no Festival de Londres, é com certeza "Affliction", dirigido por Paul Schrader.
O filme confirma a maestria de Schrader não apenas como diretor, mas como roteirista, atividade que construiu sua fama antes que passasse às suas próprias realizações. Sua colaboração com Scorsese resultou em obras como "Taxi Driver" e "Touro Indomável".
Em "Affliction", o roteiro, baseado em obra de Russell Banks, é a alma do filme. Todos os fatos são apresentados para serem questionados. Nenhum personagem merece crédito total em sua versão dos acontecimentos.
A história, de início, parece banal. Um pai divorciado luta para conseguir o amor e a atenção da filha. Aos poucos, se percebe que esse pai amoroso, policial de profissão, não é apenas vítima, mas também algoz. Sua aflição, metaforizada numa dor de dente, é sua própria violência, herdada do pai alcoólatra e, mais, perenizada por um sistema -a sociedade americana- baseado na violência.
Usando o método tradicional de centrar a câmera sobre o protagonista, o filme convence o espectador a procurar qualidades nesse anti-herói infeliz. É quase cabível que ele esmurre o padrasto da filha, que arrebente o escritório de seu chefe e que impute um assassinato a seu melhor amigo. Tudo é possível, se concordarmos com ele. Até o ponto em que não é mais possível concordar.
No estilo de um "Rashomon" e suas múltiplas versões de uma mesma história, "Affliction" é, porém, um filme linear e comercial, em nada discordante da "main stream".
Dá amplo espaço ao "star system" e à magnífica atuação de Nick Nolte. Produz, assim, o pequeno milagre de unir arte e comércio -o que, aliás, parece ser o objetivo ansiado, mas raramente alcançado, pela maioria dos cineastas atuais.
(LN)

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