São Paulo, sábado, 15 de novembro de 1997 |
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Peça faz renascer um autor maior
NELSON DE SÁ
Foi escrito nos anos 60, podem se achar passagens datadas, mas é de um outro tempo, sem esperança. Deste tempo em que "o que você ouve, o que você vê e o que você diz" nada significam. Não anuncia uma revolução. Sente estranha piedade dos homens, porque o sentimento não pode ser outro. José Vicente, o que quer que tenha feito calar-se, é um autor para disputar com Ariano Suassuna e Plínio Marcos o posto de maior dramaturgo vivo no país. Parece incapaz de uma frase à toa, um julgamento moralista, de sujeitar um personagem a seu tipo. Daí a estranha piedade. Tem carinho por uma "bicha" desvairada que coloca em cena, por um seminarista perdido no desejo de fazer o "bem" em meio ao "inferno". Sobretudo, por um Arthur que escolheu, entre o "bem" e o horror, o horror -por ser este, talvez, mais verdadeiro. Enredando tais personagens, um diálogo que parece não desperdiçar uma palavra sem conflito, cada uma sendo um nó a mais no emaranhado do "inferno". E o inferno é São Paulo. Tudo se passa no espaço fechado, claustrofóbico de um apartamento decadente do centro. O seminarista encontra seu irmão, Arthur, para o que se revela um enfrentamento da realidade -o texto é realista ao limite do naturalismo. Ao mesmo tempo, busca inusitada relação com a liturgia, sendo ambos, como o próprio José Vicente, tão apegados a Deus e aos rituais católicos. "Eu não podia mais tirar Deus de mim." A montagem de Fauzi Arap não busca trazer o texto ao presente -tão evidente. Com saudosismo, situa a peça naquele tempo, aquelas músicas, aquele figurino, como se quisesse dar a ela a montagem que não pôde receber então. O efeito é enternecedor, mas também restringe o alcance de "Santidade", bem como a "mise-en-scène" tradicional. No elenco, Mário Bortolotto responde pelas cenas de maior tributo à dramaturgia de Vicente, nos trechos mais eloquentes e profundos de Arthur, com envolvimento, paixão, mas não escapa de certo "overacting", exagero. Antonio de Andrade surpreende como a "bicha" entre histérica e trágica, e Nívio Diegues cumpre com correção o seminarista. Peça: Santidade Quando: de qui a sáb, às 21h; dom, às 20h Onde: teatro Crowne Plaza (r. Frei Caneca, 1.360, tel. 011/289-0985) Quanto: R$ 20 Texto Anterior: O LEÃO E O PREFEITO Próximo Texto: Pai Menininho deixa FHC ga-ga-gago! Índice |
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