São Paulo, domingo, 16 de novembro de 1997
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Três dúvidas que ficam

CELSO PINTO

O nível de reservas cambiais em mãos do Banco Central é hoje maior do que a posição do final de outubro, de US$ 53,9 bilhões no conceito de liquidez internacional e US$ 52,8 bilhões no conceito de caixa.
Embora tenha continuado a haver uma saída líquida de dólares em novembro, de cerca de US$ 1,2 bilhão, uma parte das reservas que estava nas mãos dos bancos privados foi revendida para o BC. No final de outubro, os bancos estavam carregando US$ 3,2 bilhões. Hoje, estão carregando cerca de US$ 1 bilhão. As reservas no BC, portanto, devem ter subido cerca de US$ 1 bilhão.
Não deixa de ser uma boa notícia, já que indica que os bancos estão menos dispostos a bancar o custo de manter dólares. Os dólares que estavam com eles, de todo modo, não saíram do país. Apenas mudaram de mãos.
A forte subida da Bolsa na sexta-feira, de 8,1%, deu um alívio para o mercado. O próprio BC, contudo, faz questão de advertir que a instabilidade internacional ainda deve durar meses e que novas turbulências podem ocorrer.
O "Emerging Markets Data Watch", publicado pelo banco americano JP Morgan, chama a atenção para o fato de que, mesmo que a defesa do câmbio possa ser bem-sucedida a curto prazo, ficarão dúvidas. Na Ásia, os governos conseguiram vencer as primeiras ondas de ataques especulativos, mas tiveram que ceder mais tarde. Em geral, depois da divulgação de más notícias.
No caso do Brasil, segundo o Morgan, três más notícias poderão levar a novas pressões sobre a moeda. A primeira seria uma perda de reservas maior do que o mercado esperava. A segunda seriam a recessão e o desemprego serem maiores do que se imaginava, o que traria dúvidas sobre a capacidade política de manter as defesas do câmbio. A terceira e mais preocupante seriam os altos juros e a queda no valor dos ativos atingir a saúde dos bancos mais forte e rapidamente do que se supunha.
"Enquanto preocupações sobre as reservas internacionais podem desaparecer em um mês ou dois, as questões sobre o crescimento econômico e os bancos persistirão por muitos meses", sugere o trabalho. "O Brasil, portanto, tem um ano delicado pela frente, no qual o crescimento vai sofrer independentemente do destino da moeda."
De fato, as preocupações do mercado têm seguido esse roteiro mencionado pelo Morgan. Em relação às reservas, há um certo otimismo de que o encurtamento do prazo de rolagem de bônus para seis meses possa funcionar, aliviando a perda de dólares. O BC aposta, também, que o crédito comercial não será afetado e que, portanto, haverá um impacto positivo da extensão dos ACC (Adiantamento de Contrato de Câmbio) para produtores de insumos para exportação.
Este mês e dezembro serão de déficits comerciais, mas tanto o BC quanto o mercado apostam que já em fevereiro ou março poderá haver equilíbrio ou saldo na balança comercial. No lado negativo, o mercado ainda espera remessas de bancos que aplicaram a longo prazo em renda fixa no Brasil e tomaram fortes prejuízos. Seriam alguns bilhões de dólares. Tampouco espera-se boas novas em aplicações externas nas Bolsas.
O que começa a preocupar, contudo, é o tamanho do prejuízo embutido no sistema financeiro e que cresce, a cada dia, graças aos juros astronômicos. Existe muito descasamento, isto é, bancos que emprestaram a prazos longos, de até dois anos, financiando a curto prazo. O salto nos juros de curto prazo gerou fortes prejuízos.
Um banco calcula que o patrimônio líquido dos bancos somava R$ 72 bilhões em setembro. Considerando as aplicações e supondo, teoricamente, que todas elas tivessem que ser refinanciadas aos novos juros, o descasamento poderia gerar um prejuízo de até R$ 13 bilhões, ou 18% do patrimônio líquido, o que seria preocupante.
Esse, contudo, é um cálculo apenas teórico, para o pior cenário. No BC, fala-se que os cálculos de perdas embutidas no sistema são "uma fração" desse valor. De todo modo, redobrou-se a cautela e as incertezas tendem a crescer.
Até porque será inevitável uma deterioração na situação das empresas. Um importante empresário nacional me dizia, sexta-feira, que espera uma recessão muito mais forte do que o governo imagina. "Só me resta acompanhar os cortes que meus clientes fizerem", diz ele.

E-mail: CelPinto@uol.com.br

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