São Paulo, domingo, 16 de novembro de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

O pacote e o desequilíbrio externo

ÁLVARO ANTÔNIO ZINI JR.

O pacote de medidas econômicas anunciado pelo governo deixou muita gente sem entender por que a crise nas Bolsas iniciada em Hong Kong acarretou medidas de contenção do consumo por aqui. Para entender essa ligação é preciso enfocar o desequilíbrio das contas externas brasileiras.
O governo brasileiro, ao permitir que o país voltasse a ter déficits significativos em conta corrente, recorreu ao caminho fácil do endividamento externo.
Assim é que a dívida externa brasileira líquida em 1996 alcançou cerca de US$ 176 bilhões e deve fechar 1997 entre US$ 205 e 210 bilhões. Para pagar os serviços dessa dívida, mais o déficit nas importações de bens e serviços e rolar os financiamentos que vencem, o país ficou dependente de financiamentos externos.
A crise nas Bolsas serviu para abalar profundamente a confiança nos mercados emergentes e a crença de que os financiamentos internacionais estariam disponíveis a juros razoáveis por um longo tempo. A perda de confiança causou a retração desses financiamentos e tornou inevitável ajustar as contas externas, sob o risco de perder as reservas internacionais e ter de declarar uma moratória dos pagamentos externos.
Muitos alertas foram feitos aos condutores da política econômica sobre os riscos de sua estratégia. Ainda em junho (29/6/97), escrevemos nessa coluna: "O endividamento externo da economia brasileira está repetindo o ocorrido nos anos 70 e traz riscos de que tenhamos um choque de ajustamento para pagar esse endividamento, semelhante ao ocorrido nos anos 80". Agora estamos começando a pagar a conta.
O ajuste oneroso que vinha sendo adiado significa transferir de 3% a 4% do PIB doméstico para o exterior. Para fazer isso, é necessário conter a demanda interna (implicando redução do salário real) e desvalorizar a taxa de câmbio.
A redução do consumo e do investimento interno precisa ser tanto maior quanto mais se insiste em manter a taxa de câmbio sobrevalorizada. Aqui chegamos a outra questão não resolvida e que é fonte de novas incertezas.
O governo vai induzir uma recessão profunda para obter um equilíbrio precário das contas externas -que só dura enquanto a economia não crescer- ou irá, em algum momento, corrigir a taxa de câmbio para permitir um equilíbrio mais duradouro?
Esse é o dilema maior ainda não resolvido pelo pacote recente.

Álvaro A. Zini Jr., 44, é professor titular da Faculdade de Economia e Administração da USP.

Texto Anterior: Mercado diz que redução foi acertada
Próximo Texto: Juro 'na lua' não atrai investidor externo
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.