São Paulo, quinta-feira, 18 de dezembro de 1997
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O caminho da fiscalização

REGIS DE OLIVEIRA

A Secretaria Municipal das Administrações Regionais, visando coibir frequentes problemas de corrupção, como denunciado pela "Folha da Tarde", vem de instituir uma ouvidoria, nela e no interior das administrações regionais.
Cabe ao ouvidor ouvir a comunidade, suas reclamações, aflições, queixas e pedidos, arrolando-os de forma a reivindicar junto ao administrador regional o atendimento de suas pretensões.
Essa é a função básica. Deveria ter outras, como legitimidade para criticar e exigir o atendimento das preocupações da população. Deve o ouvidor, ainda, ter mandato com prazo certo e não ser demissível no período de exercício.
Ao que se lê das portarias até agora baixadas, nenhum requisito é exigido dos ouvidores. As indicações, normalmente, recaem sobre quem já é servidor público e, pior, sobre quem é de confiança do secretário e dos administradores.
Ora, como alguém pode exercer bem seu mister se se encontra sujeito a vínculo de dependência da autoridade que nomeia? Para tal função não pode existir, jamais, vínculo de confiança, não podendo exercê-la quem é titular de cargo na própria secretaria.
É evidente que o nomeado cumprirá as ordens do chefe. Haverá dependência absoluta, tornando viciado o comportamento. O ideal é que o ouvidor seja indicado pela sociedade civil. Há diversas entidades que estariam dispostas a colaborar com o Poder Público.
De outro lado, é comum que o designado acumule funções. Como permitir isso, se a própria prestação de serviços já é precária? Ademais, o ouvidor deve deslocar-se do local de trabalho, ficando à disposição da comunidade.
É imprescindível que o ouvidor tenha passado limpo, sem nenhum envolvimento infracional em matéria criminal ou na vida civil. A imprensa prestaria excelente serviço à população investigando nos fóruns e dependências policiais para saber se os indicados resistem a tal questionamento.
O que precisamos, em verdade, é parar de brincar de administradores públicos. Não podemos criar expectativas que serão frustradas se os escândalos se repetirem e a sociedade sentir-se iludida.
Também impõe-se haver local onde a população possa ser atendida. Como o povo irá ao ouvidor? Os jornais noticiaram a designação? Quem são? Quando estarão atendendo a população e onde? O ouvidor só ouve? Cabe-lhe tomar alguma providência? Serão as reclamações registradas? Terá o secretário controle delas?
Se houver vontade definitiva de prestar bons serviços e de atender a população carente, é imprescindível proposta séria a respeito do tema. Se o ouvidor é demissível "ad nutum", ou seja, pode perder a ouvidoria por simples portaria da autoridade competente, qual seu interesse em afrontá-la?
Só com providências como as citadas (além de um relatório mensal sobre atividades) poderá haver controle efetivo da atividade municipal. É pouco, mas é um começo. Do jeito que está, melhor será extinguir tal função, que pouco resolverá e imporá mais dura desilusão à nossa já sofrida população.

Regis Fernandes de Oliveira, 53, é vice-prefeito de São Paulo. Foi presidente da Associação dos Magistrados do Brasil-São Paulo (1990-91).

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