São Paulo, domingo, 9 de março de 1997
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Tem satélite na linha

GILBERTO DIMENSTEIN

Vestindo-se às pressas no quarto de um motel em São Paulo, o marido fala com a mulher pelo telefone celular. Ela ligou preocupada com seu atraso.
Lamenta, irritado, estar preso no trânsito e diz que logo chegaria em casa. Desconfiada, ela pergunta se a buzina do carro está funcionando. Ele diz que sim e a mulher ordena: "Então buzina aí pra eu ouvir".
Qualquer semelhança com a realidade não é mera coincidência. O caso tem nome e sobrenome e é revelador não só de infidelidade flagrada -mas como os novos meios de comunicação cada vez mais invadem a privacidade das pessoas.
Quem acha telefone celular moderno pode se preparar. Está prestes a virar coisa do passado, como aquele telefone preto fixado à parede, com o bocal separado do sistema de recepção do som, desses que aparecem em filmes antigos.
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A partir do ano que vem um indivíduo poderá falar de qualquer ponto do planeta, do interior da Amazônia ou do Everest, no Nepal, com alguém em Manhattan ou no Rio de Janeiro. Num aparelho que cabe na palma da mão. Custo da ligação: R$ 3,00 por minuto.
Nos próximos meses será lançado um pequeno aparelho, por menos de US$ 1.000, que será a alegria dos exploradores e aventureiros. Se eles precisarem de ajuda, bastará transmitir mensagem de socorro para o computador de algum amigo; um satélite registrará a exata localização de onde saiu o pedido de ajuda, facilitando a busca.
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É o aperfeiçoamento de algo que já existe e provocou sensação nos Estados Unidos.
A socialite nova-iorquina Sandy Pittman tem paixão por alpinismo e, com um grupo de mulheres atléticas e badaladas, decidiu fazer uma expedição ao Everest. A novidade é que todo o percurso na montanha mais alta do mundo seria transmitido diariamente pela Internet, a rede mundial de computadores, através de um lap-top.
A aventura virou emocionante reportagem. O guia morreu e elas tiveram de se virar sozinhas. O aparelho que fazia as ligações, conectado a um satélite, tinha preço proibitivo: US$ 15 mil. Ou seja, 15 vezes mais que a nova invenção, uma das muitas e profundas transformações na comunicação humana que estão prestes a acontecer.
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Nos próximos três anos estão previstos US$ 60 bilhões em investimentos no lançamento de satélites, cada vez mais baratos. Segundo cálculos, em dez anos mais 2 mil serão lançados.
Seriam tantos aparelhos em órbita que a comunicação de imagens, som e texto não exigiria mais fios -fios que custam uma fortuna para instalar e, no Brasil, significam a dificuldade de se falar ao telefone ou acessar a Internet.
É tamanha a demanda por satélites que empresários americanos correm atrás dos aposentados satélites russos, planejados para carregar ogivas nucleares durante os tempos da Guerra Fria.
A socialite apavorada nas montanhas do Nepal e outros aventureiros perdidos nos confins do mundo são apenas um exemplo dos possíveis e inúmeros beneficiários do barateamento das comunicações na virada do século 21.
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Essencial é o acesso às comunidades pobres onde telefone é luxo -uma triste realidade no Brasil. Exemplo: centros de saúde passariam a receber através de um computador, que nos EUA custa cerca de US$ 500,00, qualquer tipo de informação, favorecendo consultas on-line com médicos.
Por um preço muito mais em conta, todas as escolas no Brasil poderiam ser, em futuro próximo, informatizadas, apressando a ofensiva contra a ignorância; atualmente, o governo planeja gastar quase US$ 500 milhões num programa envolvendo a compra de 100 mil computadores. Já pensou quanto dinheiro seria economizado se houvesse mais satélites disponíveis?
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A tendência é o barateamento contínuo da comunicação, com o fim do isolamento de comunidades. Pagar por uma linha telefônica, como no Brasil, é coisa de país subdesenvolvido. Aqui, por exemplo, paga-se bem pouco apenas pela instalação da linha. Em menos de dois dias tudo está resolvido. Muita gente nos EUA tem várias linhas em casa, para os filhos adolescentes, adultos e computadores.
No começo do século passado, os americanos cobravam US$ 80 por cada palavra, repito, cada palavra, enviada num telegrama à Europa; US$ 100 por minuto no telefone. Hoje, falamos praticamente de graça via Internet.
As pessoas preocupadas em desenvolver habilidades necessárias ao mercado de trabalho do futuro terão de estar com a cabeça em órbita se quiserem sobreviver.
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PS - Por falar em habilidades necessárias no século 21, quero agradecer pelo empenho de leitores desta coluna que traduziram para o português o texto sobre as exigências do trabalhador do futuro, enquete realizada nos Estados Unidos com 55 personalidades. O texto continua disponível por e-mail.

Fax: (001-212) 873-1045

E-mail gdimen@aol.com

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