São Paulo, quinta-feira, 27 de março de 1997
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MP limita pagamento de sentença judicial

SILVANA DE FREITAS
AUGUSTO GAZIR

SILVANA DE FREITAS; AUGUSTO GAZIR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Associação Brasileira de Magistrados critica governo Fernando Henrique e pede rejeição da medida

O presidente Fernando Henrique Cardoso assinou ontem MP (medida provisória) que desobriga o governo de cumprir decisões judiciais provisórias, como medidas liminares, sempre que houver risco de prejuízo aos cofres públicos.
Na prática, o governo restringiu o poder da Justiça de determinar, em caráter provisório, o pagamento imediato de aumentos salariais, como o reajuste de 28,86% pleiteado por servidores civis do Executivo.
A MP também pode beneficiar o governo em ações de outras áreas, como a privatização da Companhia Vale do Rio Doce.
Uma decisão liminar de um juiz contra o leilão da estatal não terá eficácia caso o governo comprove risco de lesão à Fazenda Pública.
Em 19 de fevereiro, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu, por 6 votos a 4, pela extensão a 11 servidores civis do Executivo do reajuste de 28,86% concedido em janeiro de 1993 aos militares.
As instâncias inferiores do Judiciário federal vinham seguindo o entendimento do STF para determinar a incorporação do índice, muitas vezes em decisões de caráter temporário (até o julgamento do mérito da ação).
Com a medida provisória, o governo só será obrigado a incluir o percentual no salário do servidor depois que a ação tiver transitado em julgado.
Isso significa que, se vitorioso, o funcionário precisará aguardar não apenas o julgamento do mérito da ação, como também eventuais decisões das instâncias superiores quando houver recursos do governo.
Risco
O subchefe para Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência, Gilmar Mendes, disse que essa é uma forma de evitar o risco de o servidor ter de devolver o dinheiro recebido se a decisão final da Justiça for desfavorável a ele.
Segundo Mendes, a MP não impede o juiz de conceder a "tutela antecipada", uma espécie de liminar, mas permite que essa decisão seja suspensa caso o governo recorra a instância judicial superior.
Ele também explicou que, se a tutela antecipada for concedida, o servidor público poderá usufruir a incorporação imediata do reajuste pleiteado desde que dê garantia de eventual ressarcimento futuro, como um depósito em juízo.
Raro exemplo
A MP do governo provocou divergências no Judiciário. O ministro Marco Aurélio de Mello, do STF, e o presidente da AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros), desembargador Paulo Medina, têm pontos de vista diferentes.
Medina afirmou que a MP privilegia o Poder Público em relação aos interesses da população, o que seria contrário ao Estado democrático.
"Espero que o Congresso, após debate mais aprofundado, rejeite a MP", disse Medina.
Em nota oficial, ele afirma que "o governo, ao impedir a tutela antecipada pela MP (...), invalida a cidadania que a eficiência do Judiciário deve garantir e ainda reduz esfera importante das ações civis públicas".
Marco Aurélio de Mello, no entanto, afirmou que esse foi um "raro exemplo" de medida provisória que atenderia aos requisitos de urgência e relevância -porque contribuiria para preservar a estabilidade econômica obtida com o Plano Real.
Segundo ele, não há interferência indevida do Executivo sobre o Judiciário, porque a limitação criada pela MP é semelhante a outras instituídas em reforma do Código do Processo Civil, em 1994.
Porta-voz
O porta-voz da Presidência, Sergio Amaral, respondeu ontem às críticas dos magistrados sobre a MP (medida provisória) que limita o uso da tutela antecipada.
"Cabe ao Executivo propor medidas, cabe aos congressistas aprovarem. Quem adota legislação sobre os assuntos judiciários não é o Judiciário", afirmou Amaral.
Segundo ele, os líderes do governo e os presidentes da Câmara e do Senado foram consultados sobre a MP. "É um caso típico onde cabe a adoção de MP", disse Amaral.

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