São Paulo, domingo, 13 de abril de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

'Progressistas' ainda guiam ação da CNBB

LUIS HENRIQUE AMARAL
ENVIADO ESPECIAL A ITAICI (SP)

Ao completar dois anos sob a presidência de d. Lucas Moreira Neves, um bispo "conservador", a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) não abandonou a linha de crítica aos governos nem deixou de lado as principais bandeiras do clero "progressista", como a reforma agrária.
Depois de 24 anos presidida por bispos "progressistas", que defendem uma igreja politizada e identificada com o ideário de esquerda, a CNBB elegeu, em abril de 95, d. Lucas Moreira Neves, expoente do grupo "conservador".
Hoje, dois anos depois, já é possível avaliar as mudanças na entidade, que realiza a 35ª Assembléia Geral em Itaici (bairro de Indaiatuba, a 110 km de São Paulo).
Comissão Episcopal
Errou quem apostava em uma guinada à direita na CNBB. A manutenção da linha política da entidade se dá "apesar" de d. Lucas.
O fato se explica, segundo bispos ouvidos pela Folha, porque a mesma assembléia que colocou d. Lucas na presidência também elegeu uma maioria "progressista" na CEP (Comissão Episcopal de Pastoral), um colegiado com nove membros que decide as políticas nas áreas de atuação da CNBB.
Entre os 6 dos 9 cargos na comissão controlados pelos "progressistas", um é estratégico: a Pastoral Social.
Ela é dirigida pelo bispo de Jales (SP), d. Demétrio Valentini. Por ter sido eleito pela Assembléia Geral (órgão máximo da CNBB) ele mantém, até, certa independência da presidência da entidade.
Foi d. Valentini que, na semana passada, chamou Sérgio Motta de "bobo da corte". Foi uma resposta aos ataques do ministro das Comunicações a d. Luciano Mendes de Almeida, que tem condenado a privatização Vale do Rio Doce.
A resposta oficial da CNBB ao ataque do ministro do governo Fernando Henrique Cardoso foi mais branda e só veio dois dias depois, por meio de uma nota assinada pelo secretário-geral da entidade, d. Raymundo Damasceno. O fato de d. Lucas não ter assinado a nota provocou mal-estar entre os "progressistas".
A reforma agrária e, em particular, a ação do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) também coloca em campos opostos d. Lucas e os bispos "progressistas".
O presidente da CNBB já tentou "abrandar" o conteúdo de manifestações oficiais da entidade sobre o assunto. Sem sucesso.
O mesmo ocorreu na Campanha da Fraternidade de 96 ("Fraternidade e Política"). D. Lucas tentou tirar do texto-base citações do poema "O Analfabeto Político", do escritor socialista alemão Bertolt Brecht. As citações, que falam sobre o risco de não se interessar por política, acabaram mantidas.
Acima da CEP, na hierarquia da CNBB, ainda está o CP (Conselho Permanente). Ele é formado pelos integrantes da CEP e por bispos das 13 regionais estaduais da entidade. Também participam representantes dos organismos da CNBB, como a CPT (Comissão Pastoral da Terra).
A escolha do pregador do retiro dos bispos em Itaici exemplifica como os órgãos colegiados da CNBB detém o poder na entidade.
Na última reunião da CP, d. Lucas apresentou o nome do pregador oficial dos retiros do Vaticano, frei Cantalamessa, para falar aos bispos reunidos em Itaici. A proposta foi rejeita.
D. Lucas cuida da moral
Em seu lugar, os "progressistas" conseguiram indicar o biblista Carlos Mesters, ligado à Teologia da Libertação (sustentáculo teórico da corrente "progressista") e que já enfrentou problemas com o próprio Vaticano por suas idéias.
Apesar de deixar a participação política de lado, d. Lucas não descuida dos temas morais.
Suas declarações costumam criticar duramente o aborto, as cenas de sexo na TV, a educação sexual nas escolas e as campanhas de incentivo ao uso de camisinhas.
Para alguns bispos, d. Lucas abriu mão do peso político de seu cargo, preferindo atuar em questões morais, muito caras à igreja. Essa ausência é ocupada pelos bispos que, há mais de duas décadas, fazem a política da CNBB.

Texto Anterior: Maluf defende prefeito e ataca Covas
Próximo Texto: FHC diz que recebe sem-terra em Brasília
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.