São Paulo, domingo, 13 de abril de 1997
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'Engarrafado passivo' é vítima no trânsito

ROGERIO SCHLEGEL
DA REPORTAGEM LOCAL

Os congestionamentos e a poluição provocados pelos carros atingem igualmente tanto o motorista que está sentado em seu automóvel, ouvindo rádio, quanto os passageiro que, em pé, se apertam dentro do ônibus.
O problema é que o "engarrafado passivo" -assim como o fumante passivo, que aspira a fumaça do cigarro alheio- é vítima de um mal que não produziu.
O sociólogo e engenheiro de transportes Eduardo Vasconcellos apresenta contas que mostram esse desvio. Diz que um automóvel produz 25 gramas de monóxido de carbono por quilômetro -perto de 18 gramas por pessoa, considerando a ocupação média de São Paulo, de 1,5 passageiro.
Isso é 28 vezes a emissão per capita de um passageiro de ônibus, cuja média é de 0,6 grama de monóxido por quilômetro.
Outro dado é que dois terços dos cerca de 2.500 mortos anuais no trânsito de São Paulo são pedestres, que, em geral, não têm carro.
Para Vasconcellos, a guerra do trânsito tem contorno político. "Nosso modelo de cidade é o da classe média, que tem carro próprio. Ela tem poder de lobby e, junto com a indústria automobilística, conseguiu impor um sistema que privilegia o automóvel."
Para o secretário Fábio Feldmann, existe uma injustiça social nas ruas. "Quem usa carro polui o ar de quem não usa e tira tempo de quem está no ônibus."
Esse enfoque está longe de ser consensual. Para Luiz Célio Bottura, consultor em desenvolvimento urbano e transporte, não se pode falar em cidade para a classe média porque "ninguém construiu a cidade, ela aconteceu".
Bottura critica a falta de planejamento do Poder Público para o sistema viário e de transportes. "O problema não é o carro, mas o afogadilho das decisões, que não têm visão de longo prazo."
Falha no coletivo
Os especialistas concordam que o transporte coletivo não é atraente e estimula o uso do carro. "O crescimento dos perueiros (motoristas de utilitários que fazem lotação) mostra a deficiência do transporte coletivo", diz Bottura.
Eduardo Vasconcellos diz que, individualmente, a decisão de usar o carro acontece de maneira inteligente, levando em conta variáveis como conforto, tempo e custo direto. "As pessoas concluem que ir de carro é melhor, porque a cidade foi feita para isso."
A Secretaria Municipal de Planejamento de São Paulo informou que a ênfase da atual administração nos transportes coletivos ficará provada pelo plano diretor, a ser divulgado amanhã.
Procurada, a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores não se manifestou.
(RSc)

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