São Paulo, domingo, 13 de abril de 1997
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Propaganda enganosa

OSIRIS LOPES FILHO

A identidade entre o presidente FHC e Fernando Collor manifesta-se dominante na entrevista concedida à "Veja", nesta última semana.
Não se trata mais de estabelecer a coincidência dos prenomes ou a convergência na prática da política dita neoliberal. É coisa batida.
O interessante é a posição em que se coloca o entrevistado. A soberba superioridade da sua visão e da sua versão sobre os fatos. Os fatos não são objetividade exterior, realidade objetiva, mas acontecimentos a serem interpretados segundo a conveniência e argumentação do entrevistado.
Não há a costumeira pompa imperial, nem o pernóstico academicismo dos pronunciamentos anteriores. Predomina uma franqueza incontida, uma singeleza cruel.
O Paulo Nogueira Batista Jr. já fez uma análise dos "segredos e mentiras" contidas nessa entrevista no seu artigo publicado na Folha na quinta-feira passada.
Mas existe um ponto ainda a ser abordado. Perguntado sobre as reformas, responde o presidente: "Essas reformas precisam ser resolvidas logo, neste semestre. Porque depois o Congresso entra num vazio, e não se vota mais nada. Mas não é uma coisa central".
O repórter estranha e indaga: como assim?
"Desde o começo -responde o presidente- me bati com a equipe econômica para não dar tanta ênfase à necessidade das reformas constitucionais. Elas são importantes, mas dizer que o Real depende das reformas é mentira. O Real não depende delas". E adiante afirma: "Mas, por motivação ideológica, a equipe econômica queria as reformas, insistia no assunto. Era um erro".
Durante dois anos o marketing governamental martelou a necessidade das reformas para a sobrevivência do Real. O ministro Kandir condicionou o desenvolvimento do país à aprovação da reeleição.
Agora, com o depoimento presidencial, surgem a luz e a transparência. Disse sua excelência que "era mentira".
No Código de Proteção e Defesa do Consumidor há uma figura penal (art. 67) que consiste em "fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser enganosa ou abusiva. Pena: detenção de três meses a um ano e multa". É como a luva encaixando-se na mão.
Há uma terrível vocação criminosa no país, a empolgar desde a Polícia Militar, os agentes financeiros, a classe dirigente. E a vítima é o povo, como sempre. Infelizmente.

Osiris de Azevedo Lopes Filho, 57, advogado, é professor de Direito Tributário e Financeiro da Universidade de Brasília e ex-secretário da Receita Federal.

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