São Paulo, segunda-feira, 14 de abril de 1997
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Johnny Clegg toca no país pela primeira vez

EDSON FRANCO
DA REPORTAGEM LOCAL

Muito antes de a world music ter virado mania mundial, havia Johnny Clegg. Inglês de nascimento e sul-africano por afinidade musical, ele toca no Palace, no próximo dia 19, em show que faz parte do Heineken Concerts 97.
Falando à Folha por telefone, da sua casa em Johannesburgo, o cantor, compositor, guitarrista e antropólogo explica que a música teve dois papéis na sua vida. Primeiro, foi uma forma de compensar o expatriação. Depois, foi o que fez Clegg se integrar ao novo país.
Ele nasceu em Lancashire, em julho de 53, foi com a família para a África do Sul aos 7 anos, viveu dois anos na Zâmbia e voltou para a África do Sul. Até então, sua educação musical -sem professores- ainda não começara.
O fato de o pai ter abandonado a família quando Clegg tinha apenas um ano e a mudança radical de endereço -motivada pelo casamento da mãe com um jornalista sul-africano- exerceram forte impacto na infância de Clegg.
"Eu senti que estava implodindo e perdendo um pedaço de mim. Antes que eu não conseguisse mais juntar os cacos, desenvolvi uma paixão pelas músicas folclóricas da Inglaterra e da Irlanda."
A sensação de desterro musical durou até o dia em que, aos 13 anos, o cantor estava indo a uma loja de discos e se deparou com um violonista zulu de rua.
O nome dele era Charlie e, segundo Clegg, ele tocava harmonias e melodias familiares à música celta, porém com afinação e ataque diferente nas cordas.
Clegg não falava zulu, Charlie não falava inglês. Por mímica, Clegg mostrou a Charlie que gostaria de aprender a tocar daquela maneira. Sorrindo, o zulu topou.
Corria o ano de 1967, e Clegg, além de uma nova música, passou a conhecer a política de segregação racial batizada de apartheid.
"A coisa foi bem até o dia em que eu fui preso pela primeira vez. Havia uma aldeia que eu costumava frequentar, onde os brancos eram proibidos. Um dia, a polícia me encontrou lá. Eles pensaram que estavam me salvando, que eu havia sido sequestrado."
Depois de aprender ritmos locais como o mbaqanga, Clegg se juntou a um músico zulu chamado Sipho Mchunu e montou a banda Juluka (doce, em zulu) em 1972.
No campo musical as coisas iam bem. A fusão do mbaqanga com melodias de apelo universal estava dando certo. "Universal Men", primeiro disco, deu ao grupo reconhecimento internacional e lastro para gravar outros seis trabalhos.
Mas no campo racial os problemas se acentuaram.
"Em meados dos anos 70, estávamos tocando em um clube. Policiais brancos chegaram e decidiram que o show deveria terminar. Mas a platéia estava tão animada que fomos em frente. Foi quando eles subiram no palco, apontaram espingardas nas nossas caras e desligaram os equipamentos."
Essa experiência foi a primeira de uma série de arbitrariedades. Era difícil levar um show até o fim.
Clegg diz que trabalhos como o seu pouco ajudaram na queda do apartheid. "Apenas serviu para mostrar que havia um outro caminho e para criar uma atmosfera melhor para as mudanças."
Motivado pela fusão musical e racial, Clegg decidiu estudar antropologia social na universidade Wits, em Johannesburgo.
"A universidade me deu a bagagem necessária para entender tudo o que o apartheid estava fazendo. Que o controle do governo sobre a vida das pessoas era absoluto. Que o sucesso ou o fracasso de alguém estavam determinados pela raça."
Com o fim da Juluka em 1985, Clegg montou, no ano seguinte, a banda que leva seu nome, acompanhada pelos músicos da Savuka. E é com eles que o cantor se apresenta no Heineken Concerts.
Sipho Mchunu, seu parceiro no Juluka, será convidado especial no show. Segundo Clegg, isso fará com que a apresentação seja metade Juluka e metade Savuka.
Além de um retrospecto da carreira dos dois grupos, Clegg aproveita a apresentação para apresentar canções inéditas.
"São músicas do CD que será lançado este mês. Ele terá uma versão zulu com o nome de 'The Bull Has Rhythm' e uma internacional, com 40% do repertório cantado em inglês, com o nome de 'Crocodile Love'."
Essa é a primeira visita do músico ao Brasil. Será uma chance para ele ampliar seu saber sobre a música brasileira, que ele diz conhecer muito superficialmente.
"Minha mãe costumava cantar muitas músicas de Tom Jobim. Conheço clássicos como 'Garota de Ipanema', é claro. Mas eu sei pouco além do fato de que no Brasil se toca samba."
"E bossa nova", completa a mãe de Clegg, que estava ouvindo a ligação.

Show: Johnny Clegg & Savuka
Onde: Palace (al. dos Jamaris, 213, Moema, zona sul, tel. 011/531-4900
Quando: 19 de abril, às 22h
Ingressos: de R$ 25 a R$ 60

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