São Paulo, domingo, 20 de abril de 1997
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A luta contra o tempo

DE NOVA YORK

Um dos primeiros médicos a cuidar de doentes com Aids no início dos anos 80, o dermatologista Marcus Conant acha que um dos principais problemas de quem está infectado pelo vírus é aceitar logo a doença. "Quanto mais cedo o início do tratamento, mais chances de haver melhoras", afirma, citando dados que mostram uma diminuição no número de mortes de homens homossexuais com Aids em 1996, mas um aumento no de mulheres e homens heterossexuais.
"Quando a doença começou, ela era vista como câncer gay. Desde o início, os homossexuais, enquanto grupo de risco, começaram a se preocupar mais. Costumavam fazer exames periódicos e detectar a doença antes de outros grupos, começando o tratamento também com certa antecedência. Não é à toa que o número de mortes de homossexuais têm caído."
Nos Estados Unidos, houve redução de 18% de mortes de homens homossexuais entre o primeiro semestre de 1995 e o primeiro de 1996. O número de mortes de homens heterossexuais cresceu 3%, e o de mulheres, também.
Presidente do Grupo Médico Conant, maior clínica particular especializada em Aids em San Francisco, o dermatologista cuida hoje de cerca de 5.000 pacientes. Em entrevista à Folha, por telefone, ele analisou o atual estágio da doença, as perspectivas da descoberta da vacina contra a Aids e a resistência de alguns pacientes ao tratamento.
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Folha - No ano passado, algumas pessoas com HIV tiveram melhora significativa com o tratamento baseado em coquetéis apresentado por David Ho. Para o sr., que acompanhou o aparecimento da doença, qual é a situação hoje? Há esperanças de ser criar uma vacina?
Marcus Conant - Houve uma evolução, um passo para a frente no tratamento. Um diagnóstico cedo é muito importante, porque, em geral, fica mais fácil, ou menos difícil, combater a doença desde o início. Mas o vírus é mutante e precisamos de mais tempo e muito esforço para combatê-lo. Houve casos de melhora, mas estamos longe de uma solução para o problema.
Folha - O quão longe?
Conant - É difícil responder. Em medicina, há avanços significativos todo dia, mas não dá para arriscar uma data para livrar a humanidade da Aids. Tenho acompanhado a luta dos laboratórios para aperfeiçoar os remédios para o tratamento e, quem sabe, conseguir uma vacina, mas é difícil fazer previsões, ficar especulando.
Folha - A doença tem crescido entre adolescentes. Estudiosos dizem que o otimismo com os avanços médicos deixou as pessoas mais relaxadas. O sr. concorda?
Conant - É um dado ruim o aumento da incidência da Aids entre os jovens. É sinal de que deve haver um recrudescimento das campanhas de prevenção. Ela é fundamental, porque a Aids continua aí.
Folha - Que mudanças o sr. vê entre a forma pela qual o portador do vírus HIV era tratado no início dos anos 80 e hoje?
Conant - Houve uma evolução em vários sentidos. Toda a discussão sobre Aids levou as pessoas a diagnosticarem a doença mais cedo, o que é melhor. Do ponto de vista social, a Aids está deixando cada vez mais de ser tão associada aos homossexuais masculinos. Mulheres e heterossexuais também são vítimas potenciais. O resultado é uma diminuição do preconceito. Melhoraram as condições de trabalho do médico, que tem mais recursos para combater o vírus do que em 81, e do paciente, que já aceita melhor a doença.
Folha - Um paciente pode chegar a tomar 40 ou mais remédios por dia, a maioria com fortes efeitos colaterais. Um pesquisador no Brasil afirmou que cerca de 30% dos doentes estão abandonando o tratamento. O sr. percebe isto?
Conant - O tratamento não é fácil, há muitos casos de pessoas que o abandonam, ou por não suportarem, ou por não aceitarem a idéia de ter a doença, ou por preferirem tratamento alternativo, mas não saberia precisar o número.

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