São Paulo, domingo, 20 de abril de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ALÉM DA REFORMA AGRÁRIA

O tema da reforma agrária tem ocupado praticamente todo o espaço da discussão pública sobre os problemas sociais e econômicos do setor rural do país. A eficiente campanha de marketing político conduzida pelo MST colabora para que o debate venha se tornando cada vez mais limitado. O aguerrido movimento dos sem-terra sem dúvida ajuda a iluminar pontos excruciantes da questão agrária. Mas a distribuição de terras improdutivas é apenas uma parte da constelação dos problemas do campo. E, ademais, o assentamento de lavradores sem propriedade ganha outra dimensão quando considerado dentro desse contexto.
Na verdade, vem se dando pouca atenção à condição dos pequenos agricultores com-terra, aos assalariados rurais e aos efeitos da modernização das empresas agrícolas, que corta postos de trabalho e coloca em difícil situação a pequena agricultura. Não há o necessário empenho na elaboração de uma política agrícola mais ampla, que leve em conta fatores como o crédito rural ao pequeno produtor ou a assistência técnica a esses agricultores. Não faz sentido investir em assentamentos de eficácia discutível quando, por outra porta, deixam o campo empresários empobrecidos ou lavradores que perderam o lugar para a mecanização.
No que diz respeito à ocupação da terra, a reforma agrária seria apenas uma das possíveis estratégias -se for estabelecido que tal projeto tenha racionalidade econômica ou uma relevância social mínima. São conhecidos os projetos de assentamentos fracassados por causa da falta de vocação e capacitação para o trabalho rural ou por falta de recursos para viabilizá-los. Mas é preciso frisar que existem outras possibilidades de ocupação das vastas terras do país -e de maneira mais prática e menos conflituosa que a da distribuição de propriedades, mesmo improdutivas.
Há terras públicas para serem colonizadas; outras são irregularmente ocupadas, o que vem causando trágicos confrontos entre posseiros e grileiros. Há também terrenos ociosos, e mesmo baratos, bastantes para tornar viáveis outras formas de ocupação da terra. Já existem projetos de arrendamento e de parceria nos quais os pequenos agricultores tocam seu negócio dentro de um esquema de articulação com empresas rurais maiores. Ou, por exemplo, com assistência privada e estatal para obter crédito e poder comercializar convenientemente sua produção.
Existem, enfim, diversas estratégias capazes de dar conta da multiplicidade de problemas no campo, muito mais amplos do que os dos acampados que o MST agrega em suas fileiras. Se elas não forem consideradas, vai-se apenas tentar cobrir um furo numa barragem que vaza incontidamente em vários pontos -a população rural deixa seu habitat por muitas razões além da simples falta de distribuição de terra.

Texto Anterior: FADIGA POLÍTICA
Próximo Texto: Reforma ou revolução
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.