São Paulo, domingo, 20 de abril de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Cabeça fria ou ...veja a conclusão

ANTONIO ERMÍRIO DE MORAES

A economia brasileira possui uma descomunal tolerância. Veja o quadro atual. As importações disparam. As exportações despencam. A balança comercial balança...
Diante de uma necessidade dramática de exportar para gerar empregos, conseguir divisas e pagar salários, os portos pararam. Greve geral. O motivo? A velha luta corporativa: a categoria diz não ter gostado de alguns artigos da lei 8.630, aprovada em 1993, que permite às empresas contratar mão-de-obra livremente, fora do monopólio sindical.
Desde a sua aprovação, a Lei dos Portos era letra morta. Agora, uma empresa decidiu utilizá-la para poder exercitar os direitos que são resguardados pela referida lei.
A categoria não gostou. Primeiro parou Cubatão; depois, Santos; e agora, todo o Brasil.
O bloqueio dos portos (exportações e importações) é um golpe devastador sobre uma nação que se debate para readquirir sua capacidade de crescer.
A oportunidade de discordar da Lei dos Portos já passou. Isso deveria ter sido feito enquanto a proposta transitou em Brasília na forma de projeto.
O que será do Brasil se cada um que discorda deste ou daquele dispositivo legal passar a impor a sua vontade pelo caminho da força, impedindo o trabalho de quem deseja trabalhar?
Todos têm o direito de discordar da legislação em vigor e até da Constituição Federal. Mas, para tanto, o Congresso Nacional está aberto. Ali é o lugar para se propor mudanças. O uso da violência contraria o be-á-bá da democracia. É o pior dos caminhos.
O Brasil está cansado de saber que os portos brasileiros são os mais caros do mundo. Para exportar uma tonelada de mercadorias pelo porto de Valparaíso, no Chile, paga-se pouco mais de US$ 4; via Roterdã são US$ 5, via New Orleans, US$ 8; via Baltimore, US$ 12; via Rio de Janeiro, US$ 23; via Santos, US$ 28! É um absurdo. Isso onera demais as exportações e importações. É o famoso "custo Brasil".
A categoria portuária sempre deteve o monopólio de contratar mão-de-obra, fixando o seu preço em patamares irreais. A Lei dos Portos acabou com isso e abriu a área para a prática da competição.
Hoje em dia, competir é regra para todos. Os grevistas reivindicam a preservação de um monopólio que contraria o bom senso, o mercado e a lei -num momento em que, no mundo inteiro, países, empresas e trabalhadores estão sendo chamados a aumentar sua eficiência.
A busca da produtividade é a marca dos novos tempos. Não há outra saída. Os que resistem a ela são definitivamente atropelados pela história.
Falando, na semana passada, para grupos europeus que também resistem às mudanças trabalhistas, um economista bastante conhecido por não ter papas na língua assim fulminou: "Se nada for mudado (nos hábitos trabalhistas europeus), as empresas e os empregos irão para a Ásia, e a Europa ficará com os sindicatos e os desempregados" (Rudiger Dornbush, "Corriere della Sera", 12/4/97).
A frase é amarga. Mas a sua lógica nos obriga a pensar. Afinal, até quando vamos manter os privilégios de poucos à custa do sacrifício da maioria? É isso que queremos para o Brasil?

Texto Anterior: As traduções de "O Corvo"
Próximo Texto: Orçamento austero e estabilidade
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.