São Paulo, sábado, 26 de abril de 1997
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Tese expõe a gênese conservadora do sindicalismo de confrontação

OSCAR PILAGALLO
EDITOR DE DINHEIRO

O sindicalismo dito "de confrontação", que teve origem no final dos anos 70, não teria chegado tão depressa onde chegou -na CUT e no PT- se não tivesse se aproveitado da estrutura conservadora das relações trabalhistas que sua própria liderança combatia.
O dinheiro das contribuições compulsórias, arrecadado por força de uma legislação arcaica que nasceu com o Estado paternalista de Getúlio, de inspiração fascista, acabou, por ironia, financiando o seu avesso, que viria, mais tarde, a assumir papel relevante na oposição ao regime autoritário.
Esse processo, marcado pela opção ambígua de crescer dentro de um modelo rejeitado, ajuda a entender tanto a rápida ascensão da oposição de esquerda como o lento desmantelamento do sindicalismo oficial, que ainda hoje está em discussão.
A gênese do novo movimento sindical brasileiro é um dos principais assuntos de "Crise Econômica & Interesses Organizados", de Maria Hermínia Tavares de Almeida, professora do departamento de Ciências Políticas da USP.
O livro, originalmente uma tese acadêmica apresentada em 1992, será lançado na semana do Dia do Trabalho.
O saldo negativo de prolongar o sindicalismo corporativo foi aumentado com o pífio resultado prático das intensas campanhas salariais. Um olhar retrospectivo mostra que os ganhos dos anos 80 foram engolidos pela inflação.
"As lutas pela indexação assemelhavam-se a uma corrida disputada na contramão de uma esteira rolante", compara a autora. "Os que se movimentaram com muita rapidez ficaram no mesmo lugar, os mais lentos andaram para trás."
Um agravante dessa derrota é que o embrião inflacionário remonta a uma cumplicidade entre elites, incluída aí a oposição aos militares. O consenso desenvolvimentista então existente tolerava alguma inflação. "Corporativismo e Estado desenvolvimentista têm inegáveis afinidades eletivas", constata a professora.
A força desse consenso foi uma das principais responsáveis pela vida curta que tiveram as duas administrações que, antes do Real, tentaram enfrentar a inflação com métodos mais ou menos ortodoxos -a de Simonsen (derrubada por Delfim Netto, com aprovação discreta dos sindicalistas) e a de Dornelles (que enfrentou a oposição liderada por João Sayad).
Para os trabalhadores, foram vitórias de Pirro, como se verificou mais tarde. A hiperinflação resultante mostrou que mesmo a indexação mensal não seria suficiente para manter o poder de compra dos salários.
Essas experiências mostraram como a esquerda parece ter dificuldade em fazer a crítica pertinente ao adversário certo. Ou erra num, ou erra noutro.
O Cruzado, por exemplo, foi criticado pela CUT não por sua inconsistência intrínseca, mas por ser um plano recessivo, quando era nitidamente expansionista.
E o Real não era simplesmente uma jogada para garantir a vitória de Fernando Henrique Cardoso, o que o eleitorado percebeu muito antes do PT, que perdeu tempo tentando atacar seu aspecto mais defensável, o impacto positivo sobre a distribuição de renda.
A nova liderança sindical, no entanto, emerge do livro com um perfil favorável.
Para além do entendimento de questões econômicas, o sindicalismo de confrontação incluiu a questão social na agenda da transição para o regime democrático, antes dominada pela defesa dos direitos civis. Não é pouca coisa.
A premissa da tese -a estratégia sindical sob inflação- desapareceu com a estabilidade. Nesse aspecto, o leitor sentirá a defasagem de cinco anos entre a apresentação do trabalho e sua publicação.

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