São Paulo, sábado, 26 de abril de 1997
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CALOR EM VEZ DE LUZ

É surpreendente, para dizer o menos, a batalha verbal travada por duas das mais altas autoridades do país, os presidentes do Supremo Tribunal Federal (STF), Sepúlveda Pertence, e do Congresso, senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA).
Os dois discutiram como se estivessem em uma sessão de "pinga-fogo", bastante habitual na história parlamentar brasileira, mas absolutamente inusitada entre os poderes Legislativo e Judiciário.
Diferentemente do que talvez pensem os puristas, o debate público entre essas instâncias não é necessariamente ruim. Mas é sem dúvida péssimo quando, em vez da troca de idéias, acusações e contra-acusações pessoais suplantam as questões realmente substantivas que estiveram na origem do debate.
Há, de fato, uma questão fundamental, que pode ser apenas vislumbrada em meio ao tiroteio retórico.
Tanto Sepúlveda Pertence quanto Antonio Carlos Magalhães trouxeram à baila o tema da esfera de atuação dos poderes e da suposta interferência indevida de um sobre o outro.
Mas, em vez de luz sobre essa temática fundamental do ponto de vista democrático, introduziram apenas o calor da troca de acusações mútuas sobre o passado de cada qual.
A sociedade brasileira ficou nos últimos anos a tal ponto presa à luta contra a inflação, atordoada por choques econômicos sucessivos, que a velha questão da transição democrática acabou ficando para um segundo plano. Para os mais otimistas, a democratização, aliás, passou a ser dada como fato consumado.
Sem a cortina de fumaça da inflação, pode-se agora ter mais consciência do quanto ainda falta avançar no estabelecimento de pesos e contrapesos para a atuação de cada um dos três poderes clássicos da democracia dentro de uma República.
É lamentável que, em vez de apresentar idéias nessa direção, a batalha de palavras entre Magalhães e Pertence tenha-se limitado à biografia dos envolvidos.

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