São Paulo, terça-feira, 6 de maio de 1997
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A nova lei do petróleo e a competitividade do Brasil

LUIZ AUGUSTO MILANI MARTINS

A privatização parcial do setor petrolífero brasileiro ocorre diante da seguinte conjuntura global: a) a indústria mundial de petróleo encontra-se na maturidade e em busca de racionalização; b) uma nova indústria mundial, de gás natural, está sendo construída nos países em desenvolvimento. É oportuno analisar a competitividade do Brasil diante desse cenário mundial.
O Brasil não terá dificuldades para atrair investimentos para a Bacia de Campos. As reservas conhecidas da Petrobrás e a liderança tecnológica que ela detém na exploração e produção em águas profundas despertam o interesse de suas congêneres para várias modalidades de acordos. Porém, a respeito da exploração nova, em áreas ainda não produtoras, o Brasil tem potencial competitivo no contexto mundial? Vejamos qual é a expressão dos três fatores de atratividade da indústria, no caso do Brasil.
Fatores geológicos. O território brasileiro tem 3,2 milhões de quilômetros quadrados de terrenos sedimentares continentais, mas a prospectividade para petróleo é mais favorável nas bacias costeiras e da plataforma continental, que compreendem cerca de 1,2 milhão de quilômetros quadrados.
O futuro da indústria de petróleo do Brasil pode depender da exploração das bacias "offshore", apesar de não se poder desprezar o potencial das bacias do Solimões e do Amazonas. As prospectividades geológicas das bacias sedimentares brasileiras, tanto "onshore" como "offshore", são muito diversas e ainda precisam e podem ser melhor evidenciadas, por meio de novas tecnologias de exploração e de produção.
O investimento feito até hoje nas bacias não produtoras é pequeno, como é pequeno o conhecimento de seu real potencial, que pode revelar gratas surpresas. Porém, para atrair companhias de petróleo estrangeiras para desvendar esse potencial, as condições dos acordos oferecidos pelo governo brasileiro precisam satisfazer as condições particulares de cada bacia oferecida para exploração. Além da prospectividade de cada uma, pesam na decisão de investimento, fatores como localização e condições fisiográficas, espessuras da lâmina de água sobre as bacias "offshore", e profundidade dos reservatórios na crosta.
Fatores econômicos. A lucratividade é uma questão complexa, dados os custos variáveis de exploração e de produção, o regime fiscal e as condições de mercado. O regime fiscal é fator crucial para atrair as companhias de petróleo. Todas as companhias de petróleo a operar no Brasil, inclusive a Petrobrás, deverão pagar participações governamentais, "royalties", e impostos federais, estaduais e municipais previstos na legislação.
Em seu propósito de atrair companhias estrangeiras para aqui realizar exploração de petróleo, o governo do Brasil não pode perder de vista as condições competitivas já estabelecidas ao redor do mundo. Por exemplo, a Irlanda e o Reino Unido decidiram incentivar a exploração "offshore" em áreas de fronteira, cobrando das empresas um único tributo, o Imposto de Renda de 33%.
A análise da competitividade brasileira, na atração de investimento para exploração, deve considerar também os objetivos estratégicos das próprias companhias de petróleo, o destino da produção e as necessidades de suprimento doméstico e o interesse das companhias em mercados emergentes. O Brasil tem a oferecer um enorme potencial de mercado de energia. O atual mercado doméstico de petróleo movimenta mais de US$ 20 bilhões por ano. Contudo, o consumo per capita anual de petróleo e gás no Brasil (3,4 barris de petróleo e 28 m3 de gás) é muito baixo se comparado, por exemplo, ao da Argentina (4,9 barris de petróleo e 770 m3 de gás).
A expansão dos mercados de gás natural é uma das prioridades industriais na América Latina, que oferece uma das melhores oportunidades para a indústria mundial de petróleo atualmente. Estima-se que a demanda de gás na América do Sul no mínimo duplicará até o ano 2010. Apesar de deter 60% do produto doméstico bruto, e 50% da população da América do Sul, o Brasil responde por apenas 5% do consumo de gás do continente.
Fatores políticos. A estabilidade institucional, política e legal, não constitui problema para o investimento estrangeiro no Brasil que, sem dúvida, pode assegurar não menos estabilidade para acordos de petróleo, do que se possa encontrar em outros países.
O investidor estrangeiro espera encontrar condições de competição justas e estabilidade e imparcialidade de regras tributárias, incorporados em uma estrutura contratual flexível quanto a prazos, programas de trabalho, infra-estrutura existente, condições de mercado e amortização de investimentos, segundo a natureza das áreas contratadas.
Neste sentido, o país pode contar com um século de experiências internacionais de acordos, legislações, regulamentos, sistemas fiscais e matérias de assuntos correlatos, para desenhar seus próprios instrumentos contratuais, segundo seus objetivos de política de petróleo.
Uma adequada estrutura reguladora, na figura da anunciada Agência Nacional do Petróleo -ANP-, será necessária para colocar em execução a política nacional do petróleo. As tarefas são complexas e diversificadas, o que exigirá uma burocracia especializada e competente para lidar com todos os assuntos, desde a licitação das áreas até o controle do abastecimento doméstico de petróleo e derivados.
O funcionamento adequado da futura ANP é pressuposto fundamental da política do petróleo e da administração dos acordos de concessão. A política do petróleo, seus instrumentos legais, e o poder administrativo para sua implementação, são três vetores que devem ter as mesmas dimensões, força, direção e sentido, para que o sistema possa funcionar com estabilidade e equilíbrio.
O que se espera da ANP é que ela seja uma agência moderna, independente, eficaz e eficiente, democrática, criativa e aberta. Não são poucos predicados e, portanto, o desafio é grande, principalmente na fase de transição da indústria. Talvez esse seja o maior desafio a superar na batalha da competitividade internacional.

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