São Paulo, quarta-feira, 21 de maio de 1997
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Mortos tinham emprego e eram 'arrimo de família'

MAURO TAGLIAFERRI
DA REPORTAGEM LOCAL

Os dois mortos no confronto entre os sem-teto e a PM que já haviam sido oficialmente identificados ontem eram os únicos responsáveis pelo sustento de famílias numerosas.
Crispim José da Silva, 28, foi atingido por um tiro na nuca. Chegou morto ao hospital Dr. Benedicto Montenegro, no Jardim Iva.
Nascido em Monte Santo (BA), Crispim Silva, que tinha nove irmãos, tentava arrumar moradia para a irmã, Zenaide, e a família dela (o marido, Luís Antônio Amêndula, desempregado há cerca de um ano, e três filhos).
Silva já os tinha hospedado em um cômodo que construiu num terreno da prefeitura no Jardim Sapopemba (leste). Ele os sustentava e ainda mandava dinheiro para os pais, em Monte Santo. Ganhava R$ 446,00 brutos como auxiliar de serralheiro na Bernardini Indústria e Comércio (Mooca), onde trabalhava há um ano.
Antes, trabalhou por seis anos na Tinturaria Bitelli de Tecidos, onde foi auxiliar de almoxarifado. Estudou até o quarto ano primário.
Segundo um irmão dele, Rosalvo da Silva, 32, Crispim estava há oito anos em São Paulo e jamais se envolveu em conflitos. "Ele era até medroso para essas coisas."
Rosalvo disse que, quando foi atingido, o irmão tentava ajudar uma menina. "Então, tomou o tiro, pelas costas. Não tem outro ferimento, só o tiro na nuca."
Ele, seu irmão José da Silva, 22, e o tio, Firmino Almiro da Silva, 40, viram o corpo de Crispim no hospital. Saíram chorando.
Os três declararam que o irmão morto era solteiro, sem filhos. "Ele tinha namorada, mas não queria compromisso sério", contaram. Não sabem quem era ela.
O cunhado dele, porém, afirmou que Crispim estaria para se casar, pois a namorada teria engravidado três meses atrás.
O outro morto identificado, Jurandir da Silva, 29, vivia com Maria Cristina de França, 36, e os quatro filhos dela. Sustentava os cinco e a sogra, Quitéria de França, que reconheceu o corpo dele no Hospital Geral de São Matheus.
Segundo ela, Jurandir trabalhava numa firma que lida com esgoto -não soube dizer qual era. Já havia trabalhado como pedreiro antes. Quitéria de França o descreveu como um "homem bom". "Só de ele cuidar dos meus netos já era bom demais", disse.
Segundo a Secretaria de Estado da Saúde, Jurandir da Silva e o outro morto -não identificado, mas que teria sido reconhecido como Geracy Reis de Moraes- chegaram ao hospital com ferimento por arma de fogo no tórax e parada cardiorrespiratória. A direção do hospital não deu esclarecimentos.
No hospital Dr. Benedicto Montenegro foram atendidas, com crises nervosas: o irmão e a irmã de Crispim, Rosalvo e Zenaide, a mulher de Jurandir, Maria Cristina, e Denise Aparecida Mendes, que teria tentado socorrer Crispim.

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