São Paulo, quinta-feira, 29 de maio de 1997
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O aplauso e a vaia

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Em geral, não tenho receio de conversar sobre qualquer assunto, entenda muito ou nada do mesmo. Se entendo, procuro ensinar. Se não entendo, procuro aprender -o que é o mais frequente. Contudo há dois temas que me deixam constrangido e dos quais procuro escapar com poucas e bem estudadas palavras.
Um deles é por que nunca me candidatei à Academia. Outro é parecido: por que em 1965, quando o finado "Correio da Manhã" elegeu quatro deputados (dois federais e dois estaduais), apesar de convidado formalmente por Tancredo Neves, eu não aceitei uma vaga na chapa da oposição. Segundo Tancredo, eu teria chances de ser um dos mais votados.
O constrangimento nasce de uma incapacidade profissional e de um acanhamento pessoal.
Tenho queridos amigos na Academia e cordiais conhecidos na vida pública. Mas não tenho nenhuma vontade de imitá-los, apesar do muito de admiração que lhes dedico.
Na Academia, nada teria a fazer ou realizar. Administrar uma imortalidade não combina com a minha mortalidade. Na política, além de nada fazer ou realizar, tenho pelo ofício uma aversão de tripa, como tenho contra o jiló e o quiabo. Nem para salvar minha pecadora alma comeria uma buchada de bode. Essas coisas pedem um estômago de camelo -e não o tenho.
Daí que considero qualquer político, em qualquer nível, do vereador de Itaperuna ao presidente da República, uma espécie de palhaço que ocupa o picadeiro. Presumivelmente, com dignidade -palhaços são dignos, estão ali no desempenho de um ofício respeitável, embora grotesco. A comparação não é ofensiva. Qualquer cidadão, no desempenho de um trabalho, merece respeito e, de acordo com o seu desempenho, aprovação ou repúdio.
Quando o palhaço me diverte, eu o aplaudo. Quando me aborrece, eu o vaio. Num e noutro caso, não apreciaria estar no lugar dele.

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