São Paulo, sexta-feira, 30 de maio de 1997
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O século da comunicação

AUGUSTO MARZAGÃO

Prestes a ingressarmos no terceiro milênio, um olhar para o século 20 nos descortina um período de extremas contradições, de tal maneira que, medido pelos seus defeitos, terá sido o século da violência e da injustiça, sacudido por duas guerras mundiais apocalípticas; avaliado pelas virtudes, nos surgirá como era iluminada por conquistas científicas e tecnológicas prodigiosas, ao mesmo tempo em que avançou substancialmente na criação de mecanismos de preservação da paz, do meio ambiente e dos direitos humanos.
Nestes quase cem anos, assistimos à ascensão e à falência dos totalitarismos político-ideológicos, vimos os homens quase levando o planeta à hecatombe nuclear e agora os vemos tornando-se vizinhos virtuais, integrando esforços, culturas, idéias e ideais pelas vias globalizantes da comunicação.
Discorrendo sobre essa matéria em recente palestra na Fundação Cásper Líbero, em São Paulo, um dos estudiosos da comunicação de renome mundial e alto executivo do sistema Televisa, do México, Miguel Alemán Velasco, transmitiu a mensagem que precisava ser ouvida por todos quantos, no pórtico do ano 2000, testemunham com assombro, mas também com inquietação a vertiginosa escalada planetária das telecomunicações, da informática, da cibernética em geral e temem uma desumanização da nova "geração digital".
Segundo o eminente mexicano, ao contrário do que muitos imaginam, o universo do software, da Internet, dos satélites de comunicação, além dos milagres tecnológicos que já nos proporcionou, como o telefone, o rádio, a televisão, o telex, o fax, não se limitará a uma maior exploração dos espaços exteriores ou do fundo dos oceanos, em busca de vantagens utilitárias para a humanidade.
Esse universo, cujas fronteiras a multimídia eletrônica superou, nos alargará ainda mais os espaços do império do espírito e do humanismo.
Por quê? Porque tais instrumentos instantâneos de internacionalização da informação pragmática, da realização de transações e negócios, constituem simultaneamente veículos a serviço do conhecimento.
Eles podem distribuir os bens da educação e do trabalho digno por todos os recantos da terra, pelas mais remotas e escondidas localizações dos povos. E assim as nações antes excluídas do desenvolvimento econômico e social alcançarão melhores níveis de bem-estar.
Diz Alemán: "Buscamos uma mídia integral, em que as evoluções da técnica constituam a base dos elementos humanistas de uma nova era. À medida que a ciência e a técnica mudam a nossa forma de viver, temos de cuidar para que os valores, as idéias, a cultura e os mais elementares conceitos de liberdade, justiça e igualdade sejam, no futuro, mais respeitados".
No século da comunicação criam-se instigantes dilemas. O homem, afinal, capacitou-se a rapidamente saber tudo o que se passa no planeta, seja graças ao rádio, à TV, aos satélites, à rede da Internet. Mas na verdade só precisa conhecer o relevante, o essencial. O excesso de informações, por intermédio dos múltiplos meios existentes, pode antes confundir do que esclarecer.
Existe um ponto, entretanto, em torno do qual não pairam dúvidas. "O homem pode criar milhões de máquinas" -observa Alemán. "Entretanto, milhões de máquinas jamais criarão o homem".
Nada substitui nada, tudo se complementa. O computador não substituirá o cérebro e a inteligência. Restarão numerosíssimas tarefas que somente os meios que nasceram e se desenvolveram, como o Homo sapiens, terão condições de conceber e materializar. Geniais programadores de software não exterminarão a categoria milenar dos artesãos.
Enfim, o especialista da comunicação nos dá uma lição de humanismo, de humildade, de esperança e de otimismo quanto ao futuro da espécie. Mergulhemos a fundo, sem nenhum receio, na sociedade do conhecimento. Ela reinará no século 21.
Os satélites de comunicação não são deuses nem astros, mas lá de cima esparzirão luzes de sabedoria, trazendo os homens de suas últimas cavernas para o sol da solidariedade e da felicidade universais.

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