São Paulo, terça-feira, 10 de junho de 1997
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Como o ex-Zaire, país é 'vítima da Guerra Fria'

HÉLIO SCHWARTSMAN
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

A turbulência política que agora afeta o Congo (o original, não o que até há pouco era chamado de Zaire) não é um fato isolado na África Central, mas se inscreve no duplo fenômeno do fim da Guerra Fria e da manutenção da estrutura tribal dos países da região. Tudo isso ainda com antecedentes na política de colonização européia do continente.
O movimento lembra o de uma moléstia que tem um foco original, mas se vai espalhando pelo resto do organismo. O foco inicial, no caso dessa nova infecção bélica, está distante, tanto no tempo como no espaço.
Tutsis x hutus
No início dos anos 90, rivalidades étnicas entre os tutsis e os hutus em Ruanda e Burundi levaram a violentas guerras tribais que provocaram um importante êxodo de hutus para o leste do antigo Zaire.
Os tutsis foram ao encalço desses hutus, criando as condições para que eclodissem outras diferenças tribais do velho Zaire (antes represadas pela mão-de-ferro do ditador Mobutu Sese Seko, este mantido no poder com a ajuda do Ocidente).
O foco rebelde no leste logo se expandiu. Mobutu caiu, e as lutas intestinas entre os clãs de origem banta do Zaire ("grosso modo" semelhantes às do Congo) não respeitaram as fronteiras criadas pelos europeus, rapidamente avançando para o território sob administração de Brazzaville.
Marxismo
Diferentemente do Zaire, contudo, o Congo havia sido um país de orientação marxista-leninista e regime de partido único até 1991, quando, às vésperas do colapso da URSS, o antigo todo-poderoso Partido Congolês do Trabalho promoveu uma abertura política e, em meio a uma sucessão de governos militares, foi adquirindo feições mais social-democratas.
Apesar de nominalmente marxista, o Congo recebia ajuda econômica tanto de países do Leste Europeu como do Ocidente. Ainda que visceralmente pobre e doente, o país foi um dos que obteve mais progressos nos indicadores sociais neste final de século (o PIB cresceu mais do que a população e as taxas de analfabetismo são uma das menores para a região).
Infelizmente, as rivalidades tribais (às vezes travestidas de ideológicas) parecem ser, ao mesmo tempo, mais antigas e duradouras do que a colonização européia e a própria Guerra Fria.

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