São Paulo, sexta-feira, 20 de junho de 1997
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Ética e reformas

CARLOS EDUARDO MOREIRA FERREIRA

O Brasil vive períodos cíclicos, alternando estados de extrema euforia e profunda depressão. Nas últimas semanas, andamos meio na baixa. E voltam à crônica do cotidiano algumas expressões já consagradas no imaginário popular, como "à beira do abismo", "o país não tem jeito mesmo", "todo político é ladrão" e por aí vai.
A imprensa dedica generosos espaços à compra de votos, aos precatórios, às ligações perigosas do PT e a outros escândalos do gênero. Dá-se ênfase aos indicadores desfavoráveis na balança comercial, à suposta iminência de medidas recessivas, a problemas no crédito externo.
Como o país, depois de décadas de calamidade inflacionária, vive um raro período de estabilidade, até parece que alguns setores se sentem saudosos das metáforas catastrofistas.
Na falta de fortes emoções, numa economia carente de crises profundas, passamos a dar importância às nuvens cinzentas que obscurecem o cenário, aderindo à nova onda de pessimismo.
Ora, vivemos numa democracia, e é próprio dos regimes democráticos o livre exercício da expressão. O círculo do medo que prevaleceu em outras épocas foi rompido há muito. É natural, portanto, que os jornais ostentem manchetes fortes, como as dos escândalos financeiros e políticos, pois, segundo a máxima atribuída a William Hearst, "más notícias são boas notícias". Seria, no entanto, leviano e irresponsável confundir esses fatos pontuais e localizados com a situação geral do país.
Em vez de assumirmos uma postura moralista e inquisitória, deveríamos nos congratular por termos uma mídia atuante e investigativa, que passou por difíceis períodos de censura. Finalmente não estamos varrendo as mazelas nacionais para debaixo do tapete. E isso é muito positivo, pois nos torna mais responsáveis e vigilantes, mais atentos ao respeito às leis, mais dispostos a exercer plenamente a cidadania.
Ressalte-se que essa circunstância -envolvendo escândalos financeiros e denúncias contra políticos-, seguida de uma onda moralista, não é exclusividade brasileira. Ocorre em muitos países e diferentes culturas. Mas, ao contrário de outras épocas, tem reforçado uma saudável preocupação com a ética, na política e nos negócios.
Há indicações concretas de que avançamos no cuidado com a coisa pública e no respeito às instituições. Na área privada não é diferente. Um número significativo de empresas, no Brasil e em muitos países, elabora e torna públicos seus códigos de ética, que regulam suas relações com os diversos públicos de seu interesse.
Essa preocupação se torna mais abrangente pela vigência da globalização e estende-se aos direitos dos consumidores, ao meio ambiente, enfim, à cidadania, agora defendida por códigos, normas e um grande número de organizações não-governamentais.
A ética, por esses motivos, torna-se mais um fator competitivo no mercado internacional. Por essas mesmas razões, o país deve rever seus processos e procedimentos, para ganhar mais credibilidade no cenário das nações.
Nesse sentido, torna-se imperioso resgatar de vez a auto-estima brasileira, a confiança no país e em suas instituições. Para tanto, é fundamental que cada agente social cumpra sua tarefa, contribuindo solidariamente para a construção da nação.
O empresariado tem feito sua parte, modernizando formas de gestão e equipamentos, reduzindo suas margens de ganhos, aprimorando a qualidade dos processos e dos produtos. O mesmo se exige do Estado, das autoridades dos três poderes, dos políticos.
Não é preciso ser cientista social para constatar isso. Basta perguntar ao cidadão comum quando é mal atendido nas repartições públicas, quando sua família não recebe tratamento adequado nos hospitais conveniados do INSS, quando processos se arrastam nos labirintos burocráticos dos tribunais. No nosso entender, tudo isso tem a ver com as reformas estruturais e constitucionais. E também com a ética.
Quando clamamos pela aceleração dessas reformas -como faremos mais uma vez no "Fórum das Reformas -A Nação tem Pressa", no próximo dia 23, na sede da Fiesp-, o que nos move são os interesses mais gerais da sociedade e a busca de transparência nesse processo, que não pode ser condicionado por trocas, barganhas e favorecimentos pessoais ou setoriais.
Para que se restaure de vez a esperança dos brasileiros no futuro, mais do que nunca é necessário que as relações, na esfera pública ou privada, sejam pautadas por estritos conceitos éticos.

E-mail: cemf@fiesp.org.br

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