São Paulo, domingo, 20 de julho de 1997
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Na contramão da Bolsa

CELSO PINTO

Desde que a Bolsa começou a despencar, na sexta-feira dia 11, até anteontem, o Ibovespa caiu 15%. Para dois fundos de ações, contudo, a queda foi muito menor: no administrado pela Investidor Profissional a perda foi de 2,5% e no administrado pela Dynamo foi de 3,6%.
Não é milagre, nem genialidade. Esses dois fundos são uma espécie rara no mercado acionário brasileiro: eles só investem em empresas privadas, de segunda ou terceira linha, cuja adminis tração eles conhecem, acompanham e, em muitos casos, assessoram.
São fundos que não olham manchetes de jornal e não escutam o que o ministro Sérgio Motta diz. A aposta é outra, de longo prazo. Se as empresas que eles escolhem forem bem-sucedidas, é provável que em alguns anos a valorização de suas ações supere a média. É preciso, contudo, paciência e sangue-frio. Os dois fundos passaram ao largo da espantosa escalada recente das Bolsas. Neste ano, enquanto o Ibovespa subiu 66,6% até quinta-feira, o fundo da Investidor subiu menos da metade, 25,3%, enquanto o da Dynamo subiu 28,8%. Em um ano até quinta-feira, o Ibovespa subiu 88,7%, enquanto o fundo da Investidor subiu 34,7% e o da Dynamo, 45,1%. Mesmo assim, tanto o fundo da Dynamo, hoje com R$ 60 milhões em patrimônio, quanto o da Investidor, com R$ 50 milhões, não tiveram saques anormais, segundo seus administradores. Uma razão é a exaustiva explicação aos investidores que os fundos vão sempre ficar atrás, em momentos especulativos, mas tendem a cair muito menos quando o mercado despenca e a ganhar mais a longo prazo. Entenda-se longo prazo como vários anos. Em junho, quando as Bolsas estavam eufóricas, o relatório da Investidor a seus clientes anunciava a decisão de reduzir de 90% para pouco mais de 80% o total de recursos aplicados nas Bolsas. A razão: vários investimentos haviam atingido "preços que consideramos racionalmente justificáveis e foram, portanto, liquidados". Ou seja, "a relação risco/retorno não nos parece aceitável".
Hoje isso parece muito sensato, mas, na hora, tratava-se de explicar por que o Ibovespa em junho subiu 10,3% enquanto o fundo da Investidor subiu apenas 0,7%. Em compensação, neste mês, enquanto o Ibovespa caiu 11% até agora, o fundo da Investidor caiu apenas 0,8% e o da Dynamo, 0,2%.
O Ibovespa é um índice que reú ne as 49 ações de maior liquidez. Telebrás, Eletrobrás e Petrobrás representam 74% do índice. É um espelho fiel das aplicações especulativas, comuns nos fundos externos, que vivem de boatos e geram rápidas fortunas e desastres. Nos últimos dez dias, a volatilidade do Ibovespa atingiu 84%. A do fundo da Dynamo ficou em 15%. Tomando apenas os dias de maior agitação recente, a volatilidade do Ibovespa chegou a 125% e a da Investidor ficou em 10%.
O fundo da Investidor opera apenas com 19 empresas, com ênfase em Lojas Renner e Livraria Saraiva. O da Dynamo concentra operações em 20 empresas, com destaque para Ipiranga e Brahma.
A longo prazo, a racionalidade dos fundamentos está ganhando. Quem aplicou desde o início do fundo da Investidor, em fevereiro de 93, ganhou 520% em dólares, enquanto o Ibovespa subiu 458%. Desde o início do fundo da Dynamo, em setembro de 93, até hoje, a valorização em dólares foi de 778%, enquanto o Ibovespa subiu 269%.
Papéis em queda
A queda das Bolsas brasileiras levou a uma queda também dos papéis no exterior. O prêmio pago pelos títulos da dívida ("bradies") e pelo bônus global recém-lançado pelo Brasil, sobre os títulos do Tesouro americano subiu cerca de 0,4%.
Muita gente no mercado internacional acha que papéis de países emergentes, em geral, ficaram baratos demais e deixaram de refletir os riscos. A chave do futuro, contudo, continua sendo a economia mundial. Se a liquidez continuar gigantesca e os juros não subirem demais, muita gente acabará buscando mais rentabilidade onde quer que seja. Inclusive brasileiros: no recente leilão de títulos do governo da Bulgária, havia vários bancos brasileiros fazendo ofertas.

E-maill: CelPinto@uol.com.br

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