São Paulo, domingo, 20 de julho de 1997
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Jogo arriscado

ÁLVARO ANTÔNIO ZINI JR.

O sobressalto causado pelas flutuações da Bolsa pede um balanço da situação criada para a economia. A crise na Bolsa foi motivada pelo medo de uma crise cambial, na esteira dos problemas passados por países asiáticos; pouco há que discutir disso.
Assim, esse episódio deixa como lição cristalina que os mercados se preocupam sim com a sustentabilidade da taxa de câmbio do real e essa preocupação não irá passar até que o déficit em conta corrente seja menor, e as exportações, crescentes.
Para afastar a crise, o governo brasileiro tomou duas decisões. Manter a taxa de juros elevada para continuar a atrair os recursos necessários para financiar o déficit na conta corrente e usar os recursos da privatização para diminuir a dívida pública.
O objetivo do governo é convencer aplicadores de que manterá o controle do déficit fiscal e que conseguirá financiar o déficit externo, sem precisar desvalorizar a taxa de câmbio, pelo menos até o fim de 1998. Com isso, o governo aposta em um jogo arriscado e custoso porque está apostando contra alguns fatores que o mercado já toma como certos.
O primeiro é a convicção de que o déficit na conta corrente é excessivo, precisa diminuir e isso requer uma desvalorização na taxa de câmbio para que as exportações possam crescer. Já não se discute mais se uma desvalorização é necessária, mas quando e como isso irá ocorrer.
A aposta do governo é de que conseguirá financiar o déficit externo previsto em US$ 32 bilhões para este ano e algo entre US$ 38 a 40 bilhões no próximo ano. Mas tomar mais financiamento não resolve o problema de como fazer crescer as exportações. Apenas adia o problema.
Alguns comentaristas têm utilizado argumentos cada vez mais toscos contra a desvalorização, baseados no medo. Dizem que isso traria a volta da inflação e seria o fim do real. Isso é argumento de filme de terror, sem muita base. A experiência internacional mostra que isso não é assim; mas quanto mais se espera, pior.
Assim, o governo coloca-se em uma situação arriscada. Irá elevar seu endividamento interno e externo até o final de 1998, pagar uma conta de juros crescente e crê que as reservas internacionais permitem defender a moeda.
Mas as últimas semanas deixam claro que as reservas internacionais baixam rapidamente diante de um ataque especulativo baseado em fatores fundamentais. Os valores envolvidos na compra e venda de câmbio futuro são enormes e possibilitam esses ataques. Pior ainda é quando o mercado espera que após a eleição de 1998 seja necessário fazer a desvalorização da taxa de câmbio em uma situação mais vulnerável e com data conhecida.
O melhor seria corrigir parte da sobrevalorização cambial neste ano para não ficar encurralado no final do próximo ano. Mas parece que iremos ver o jogo arriscado sendo jogado até a eleição.

Álvaro A. Zini Jr., 44, é professor titular da Faculdade de Economia e Administração da USP.

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