São Paulo, domingo, 20 de julho de 1997
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Conclusão apressada

ANTONIO ERMÍRIO DE MORAES

O exame dos balanços de 1996 mostra que muitas empresas estrangeiras estabelecidas no Brasil apresentaram lucratividade superior à das brasileiras.
O que explica essa diferença? Será que o "custo Brasil" não incide sobre as estrangeiras ou os seus profissionais são mais competentes do que os brasileiros?
Esse tipo de comparação, embora sedutora, deve ser feita com cuidado. É preciso saber se os dois tipos de empresas desfrutam das mesmas condições. O que dizem os dados?
No quadro atual, com raras exceções, as empresas estrangeiras estão gozando de mais proteção do que as brasileiras. Por exemplo, a alíquota de importação de automóveis é de 63% enquanto a de autopeças é de 2%. No primeiro caso, predominam as multinacionais; no segundo, as nacionais. O mesmo acontece com os tratores rodoviários (que têm alíquotas de 55%), aparelhos eletrônicos (32%) e outros setores.
A lei 9.449/97 do regime automotivo garante uma redução de 90% do imposto de importação de máquinas e equipamentos, ferramental, moldes, instrumentos, acessórios, sobressalentes, matérias-primas, componentes, conjuntos, subconjuntos e até peças de reposição.
No caso do Norte, Nordeste e Centro-Oeste, essa isenção é de 100% (lei 9.440/97). Além disso, as montadoras estão isentas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), Imposto de Renda (IR) e Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre as operações de câmbio.
É claro que isso ajuda quem é protegido e prejudica quem tem de competir. Mas as diferenças não param aí. No ímpeto de atrair investimentos estrangeiros para o setor automotivo, o governo oferece às empresas estrangeiras o que as brasileiras não conseguem nem com vela acesa.
Os Estados, contornando a Constituição Federal (que proíbe isenção de ICMS), concedem generosos empréstimos, a juros subsidiados, para as empresas estrangeiras pagarem no tempo apropriado. O BNDES está fazendo o mesmo para empresas estrangeiras que participam de privatizações do setor elétrico e outros.
As prefeituras fazem doações de terrenos -e dão facilidades de IPTU- para a construção de indústrias que, para os brasileiros, só podem ser adquiridos a peso de ouro.
Desníveis dessa magnitude seriam suficientes para explicar a aludida diferença de desempenho. Mas há mais. As empresas estrangeiras desfrutam da possibilidade de fazer investimentos e trazer tecnologia do exterior pagando juros de 8% ao ano enquanto os poucos empresários nacionais que conseguem crédito têm de pagar, no mínimo, 20%.
Quando se leva tudo isso em conta, é evidente que a tolerância das empresas estrangeiras ao famigerado "custo Brasil" é muito mais alta -o que me leva a concluir que o empresário nacional é um verdadeiro herói quando consegue sobreviver em ambiente de alíquotas zero, juros de 20% e impostos da ordem de 31% do PIB.
O capital e as tecnologias estrangeiras são essenciais para o Brasil, mas a isonomia com as empresas nacionais também é. Comparações apressadas geram conclusões equivocadas.

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