São Paulo, domingo, 27 de julho de 1997
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Sérvios vencem croatas, no futebol

The Independent
de Londres

ANDREW GUMBEL
EM LONDRES

A última vez em que as equipes de Zagreb e Belgrado se enfrentaram no futebol, em 1990, o evento acabou em violência e quase desencadeou as guerras na ex-Iugoslávia. Na quarta-feira, pela primeira vez desde a guerra, o Dínamo de Zagreb (hoje batizado de "Croácia") se arriscou na toca do leão a jogar com o Partizan Belgrado, pela rodada de classificação da Copa dos Campeões da Europa. O Partizan venceu por 1 a 0, em um jogo sem violência, com apenas um cartão amarelo.
Foi um sinal -hesitante- de progresso nas relações entre sérvios e croatas. Porém, ilustrou como a política étnica e nacional nos Bálcãs se tornou bizarra.
O time croata arrastou-se até Belgrado, mantendo-se isolado no Hotel Intercontinental, longe do centro. Havia os jogadores, a equipe administrativa, um grupo de jornalistas croatas e um considerável contingente policial privado.
No centro, torcedores do Partizan passaram a tarde desfilando pela rua principal, gritando slogans, tocando buzinas de carros e apitando nos mesmos apitos usados nas ruas pelos manifestantes contra o governo sérvio, durante três meses do inverno passado.
Não chegaram a acontecer embates violentos entre os dois lados: os torcedores croatas não se arriscaram a ir até Belgrado.
Foi um evento esportivo ou um exercício surreal de política balcânica? Um dos torcedores do Partizan, Emir Kurtovic, 22, disse: "Não poderia ser uma simples partida de futebol, depois de todas as crises e a guerra."
Kurtovic era o resumo da maluquice do evento. Ele não vive em Belgrado -veio de Novi Pazar para assistir, um indicativo de que a partida não foi uma disputa entre Belgrado e Zagreb, mas entre a Sérvia e a Croácia. Ele é muçulmano, mas empresta voz à causa nacional sérvia. Os Bálcãs são agora um lugar extremamente confuso.
A confusão era mais evidente na composição dos times. O jogador mais importante do Croácia de Zagreb, o ala Robert Prosinecki, 31, antigamente jogava para o Estrela Vermelha de Belgrado e integrou o time que venceu a Copa Europa, em 1991. Foi fotografado apertando a mão do presidente Slobodan Milosevic. Passou a guerra jogando na Espanha, antes de ser comprado pela equipe de Zagreb.
Quanto ao Belgrado, seu goleiro, Ivica Kralj, ganhou destaque nos jornais de Zagreb porque dizem que é de origem croata.
Esses paradoxos expõem ao ridículo o nacionalismo que moveu a partida de 1990 entre o Dínamo e o Estrela Vermelha, no estádio Maximir, em Zagreb. No dia fatídico, os torcedores de Belgrado derrubaram as barreiras que os separavam de seus rivais, desencadeando batalhas campais que se espalharam para o campo e para as ruas. O árbitro não conseguiu nem mesmo iniciar a partida, e nem mesmo a polícia pôde impedir o confronto entre as duas nacionalidades.
Desde então, o futebol anda em baixa na Iugoslávia. Muitos dos melhores jogadores preferiram jogar no exterior. O esporte vê uma retomada modesta na Croácia, graças, em parte, ao presidente Franjo Tudjman, que deu ao Dínamo seu novo nome e ajudou a conseguir o financiamento necessário para a compra dos passes de jogadores como Prosinecki. Mas mesmo o presidente tem seu lado ambivalente. Na década de 60, quando era general no Exército iugoslavo, ele também foi presidente de um time de futebol muito conhecido: o Partizan, de Belgrado.

Tradução de Clara Allain

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