São Paulo, quinta-feira, 7 de agosto de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Paraplégicos podem fazer greve de fome

AURELIANO BIANCARELLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Os cerca de 40 presos paraplégicos da Penitenciária do Estado, na zona norte de São Paulo, estavam ontem à noite ameaçando começar uma greve de fome.
Eles afirmam que dois presos morreram por falta de cuidados médicos no mês de junho e que outros podem morrer por falta de condições mínimas de saúde.
"Preferimos morrer de fome do que morrer comido pelas feridas e dores", diz a carta enviada pelos presos ontem à Pastoral Carcerária e ao juiz-corregedor dos presídios, Ivo de Almeida. Representantes de várias entidades de direitos humanos entrarão hoje na penitenciária para ouvir os presos.
Os paraplégicos vêm denunciando, desde o ano passado, as precárias condições de saúde em que se encontram. Nas várias cartas enviadas, os presos dizem que não recebem visita médica e que as escaras ou feridas são tratadas com pó de café e açúcar. As escaras nas costas, nádegas e pernas são provocadas pela longa permanência na cama ou em cadeiras de roda.
Não há fisioterapia. São outros presos, com instrumentos improvisados, que "operam" as feridas, cortando a pele já necrosada.
Os doentes afirmam que dividem o espaço com ratos e insetos e que, a cada denúncia que fazem, sofrem represálias e ameaças por parte dos funcionários.
O padre Francisco Reardon, da Pastoral Carcerária, disse que as duas mortes ocorridas em junho poderiam ser evitadas. Um dos presos já teria acertado a internação em um hospital de Campinas, onde tem família. O outro também teria morrido esperando a transferência para um hospital público.
Por falta de material adequado, sondas são reutilizadas e garrafas de refrigerante substituem recipientes para urina.
Na carta enviada ontem, os presos dizem que "a situação está se agravando a cada dia mais". "Muitos de nós estão atrofiando a última parte do corpo que ainda pode mexer, que são os braços, por falta de fisioterapia."
Em outro trecho, eles afirmam que, no estado em que se acham, não constituem mais risco para a sociedade. "O único perigo que podemos causar é o nosso mau cheiro, porque dependemos de outras pessoas para nos limpar."
Em março passado, representantes de várias entidades estiveram visitando os presos paraplégicos. Na época, a Secretaria da Administração Penitenciária prometeu providências.
Há cerca de um mês, o juiz Almeida voltou ao presídio e nada tinha mudado. "É tão triste quanto o IML", disse, referindo-se ao instituto onde são feitas necropsias de vítimas de mortes violentas.
Ivo de Almeida disse que o Judiciário está estudando uma forma de "indulto humanitário" que possa beneficiar parte desses doentes. Presos em estado terminal ou irreversível já estariam sendo beneficiados por indulto.

Texto Anterior: FHC defende controle populacional no Brasil
Próximo Texto: Chuvas causam congestionamento no Rio
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.