São Paulo, quinta-feira, 7 de agosto de 1997
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Personagem deve chegar a Hollywood

OLIVIER SÉCURET
DO LIBÉRATION

Ninguém antes dela havia atingido esse status: Lara Croft é a primeira estrela virtual prestes a se tornar uma notoriedade mundial.
É claro que existiram alguns precursores, como Max Headrom, o pioneiro, apresentador sintético dos anos 80 do britânico Channel 4, exibido no Brasil pela Manchete.
Houve também o fracasso da ninfeta saltitante Kyoko Date, criatura 100% digital que invadiu o "hit parade" japonês com seus sucessos edulcorados, entre os quais "Love Communication".
Mas nunca um personagem sintético havia penetrado tão longamente as paisagens do mundo real como Lara Croft.
Jamais uma pura invenção, uma personalidade imaterial, havia sido levada tão a sério por uma variedade tão grande de agentes econômicos, culturais e artísticos.
Em sua origem, é a heroína de um videogame. Não um videogame qualquer, mas "Tomb Raider", o maior sucesso atual no setor. "Tomb Raider" arrasou com os amadores: grande beleza plástica, sutilidade técnica (liberdade de movimento, desafios submarinos etc.) e uma tensão dramática razoavelmente densa.
Lara Croft é você. Ela está lá para obedecer às suas vontades no joystick e correr em seu lugar do Egito ao Peru, mergulhar nas sepulturas mitológicas do rei Midas ou de Qualopec, sempre em busca do "Scion", jóia demiúrgica deixada pelas civilizações da Atlântida...
Lara Croft nada, saca, persegue e dá tantos saltos perigosos quanto você quiser. Ela luta contra gângsters, múmias sanguinárias, lobos, panteras, crocodilos e até um tiranossauro rex.
Curiosamente, os primeiros a se surpreenderem com essa epidemia foram os próprios criadores de Lara Croft: a empresa de softwares Eidos Interactive, um peso-pesado dos jogos eletrônicos, que teve a feliz idéia de incluir em seu catálogo este game inventado pela Core Design, uma pequena empresa situada em Derby, Inglaterra.
Ao adquirir a Core Design, a Eidos garantiu o controle sobre Lara, já que Toby Gard, seu criador, renunciou a seus direitos sobre a criatura para fundar sua própria empresa.
"Eu não sou nem apaixonado nem desprezo Lara Croft. Acho apenas que não é muito normal amar loucamente algo que eu mesmo inventei. Seria um pouco como 'A Noiva de Frankenstein' para mim", declarou Toby Gard.
Sobre o triunfo cultural e de mídia da personagem-fetiche, os que desenvolvem o próximo episódio de Lara ("Tomb Raider 2") têm uma explicação: é porque Lara é mulher, a primeira deste nível em um game de ação.
Em sua grande parte masculino, o público dos games encontrou em Lara uma companheira nada habitual.
Mas a valorização de uma heroína também levou à "Tomb Raider" um público feminino bem superior ao habitual.
Um sinal a se considerar, já que no Japão, mercado-guia do setor, as jovens são a porção crescente da clientela.
Guru
No arquipélago, onde o mercado de games atingiu US$ 15 bilhões no ano passado, a "computer culture" já tem seu guru.
É Toshio Okada, da Universidade de Tóquio, inventor do game "Princess Maker", vanguarda de uma nova geração de games baseados em relações virtuais.
Observador engajado da geração dos "otaku", os fanáticos por games e computadores, ele prevê cada vez mais criaturas virtuais povoando nossa paisagem.
"Estamos trabalhando com a introdução de emoções humanas nos softwares. Os videogames são os romances da nossa época", diz.
Nesse espírito, em breve será lançado no Japão um novo game em PlayStation: a educação "realista" de um bebê humano, que, nos moldes de um Tamagochi, o bichinho virtual, precisará ser criado, alimentado, instruído e cuidado...
O sucesso de Lara Croft tem limite? Até onde se pode ir sem esgotar o filão? Em setembro Lara inicia suas aparições regulares no programa Cyberflash, do francês Canal+.
Para o Natal está prevista a edição de uma HQ Lara Croft na França. Hollywood já se atiçou.
"Com certeza haverá um filme" adianta a Eidos France. "No momento estamos em negociação com os americanos para começar a produção no final de 98. Deverá ser no estilo 'Indiana Jones', feminino, com atores de carne e osso."
Deve-se prestar atenção a Lara pelo que ela prenuncia e do que ela é o sintoma.
Como uma sentinela avançada de um mundo virtual, que ainda engatinha, mas que terá certamente espaço e atenção cada vez maiores.

Tradução Luiz Antonio Del Tedesco

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