São Paulo, sábado, 20 de setembro de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Crimes hediondos

ARMANDO TAMBELLI JUNIOR

No caso do projeto nº 724/95 sobre os "crimes de especial gravidade", aprovado na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, de iniciativa da Presidência da República, convém que se adote o bom caminho da prudência.
Os motivos para assim proceder são muitos. A sua apresentação baseia-se em argumentos de ordem jurídica e criminológica, inseridos na necessidade de revisão da parte especial do Código Penal. O projeto enviado ao Senado buscou dar andamento a uma reforma que já está se processando.
A exposição de motivos do ex-ministro Nelson Jobim incorpora contribuições que especialistas debatem há tempos. Normas penais esparsas e complementares ao código, como a lei 8.072, de 90, que trata dos crimes hediondos, alterada pela lei 8.930, de 94 (batizada lei Glória Perez), criam incongruências no interior do sistema penal e dificultam aplicação de preceitos e julgamento de crimes.
O projeto, longe de abrandar penas, deseja, com a designação "crimes de especial gravidade", categorizar mais objetivamente certos crimes, não só os hediondos, e até tratá-los com mais rigor.
Aconselha alterações no artigo 33, que trata das penas restritivas de liberdade, resolvendo uma pendência ignominiosa do Estado, que mantém em regime fechado presos condenados ao regime de albergue ou semi-aberto, e informando o rol dos crimes de especial gravidade, incorporando restrições penais contidas na Constituição que não estavam no código.
Propõe ainda modificações nos artigos 121, que trata do homicídio, acrescentando os crimes de justiceiros; 334, qualificando e apenando mais severamente o contrabando de armas e/ou munições; 213 e 214, crimes contra a liberdade sexual referentes a menores, retirando uma contradição que favorece os réus na matéria.
A celeuma está na proposta de modificação do parágrafo 4º do artigo 33 e do inciso 2º do artigo 83, que propõe alterar o regime de cumprimento de pena dos "crimes de especial gravidade".
Ela incorpora, como vimos, os chamados crimes hediondos. O que se deseja é adequar o rigor da pena, que está mantida, com o regime de progressividade.
A criminologia moderna demonstra que não é a dureza ou a extensão da pena que coíbe a criminalidade, mas a certeza da punição. Cumpridas as cautelas que o projeto prevê, o apenado nos crimes de especial gravidade pode sonhar com algo que não seja nosso deplorável sistema penitenciário e suas rebeliões, fugas, corrupção...
Em matéria penal, o fio que divide vingança e justiça é, por vezes, imperceptível, e a vingança não deixou nenhum lugar do mundo, ao longo da história, mais seguro.
São contraproducentes leis feitas a toque de caixa para responder, demagogicamente, a clamores e indignação momentâneos. Não é o caso dessa proposta, maturada e pensada. Seria conveniente que todos os que se manifestam a respeito a lessem. Do contrário, continuarão dizendo impropriedades.

Texto Anterior: Agressor abusa de superioridade
Próximo Texto: Falácias da igualdade
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.