São Paulo, terça-feira, 23 de setembro de 1997
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Entre a recessão e o estrangulamento

LUÍS NASSIF

As contas nacionais estão melhores do que o FMI supôs em seu último relatório. Houve ligeira melhora nas contas externas, alguns sinais mais consistentes de recuperação, ainda que tímida, nas exportações de manutafurados e redução da tendência de crescimento do déficit público. Essa é a impressão geral de consultores de mercado.
Mas esses números têm um preço caro: a redução sensível da atividade econômica, configurando um quadro claramente pré-recessivo. Os índices de inadimplência batem recordes, esgotou-se o ciclo de crescimento dos bens duráveis, salários deixam de obter ganhos reais e emprego industrial continua em queda.
Esse torniquete sobre a economia vem sendo aplicado pelo Banco Central, por meio de uma política monetária extremamente restritiva.
Juros altos visam:
1) Reduzir a atividade econômica, gerando excedentes exportáveis.
2) Atrair dólares do exterior, para manter intacto o nível das reservas.
Na ponta das aplicações, os juros são mais que suficientes, vis-à-vis as taxas internacionais, para atrair capitais externos. Aparentemente, o Banco Central não as reduziu mais ainda, com a deflação registrada, com receio de que o Fed americano aumente suas taxas, obrigando a um recuo na política de redução dos juros internos.
Mas no front do crédito, as taxas continuam indecentemente elevadas. E visam, justamente, gerar excedentes exportáveis e reduzir o nível das importações.
Resultado: inadimplência de Norte a Sul, desânimo, frustrações.
Pouca atividade
No momento, a atividade econômica sustenta-se em apenas duas pernas: a construção civil e a indústria de base, ambas sem poder de alavancar a economia como um todo.
O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) tem se constituído no único órgão a praticar uma política anticíclica, aumentando sensivelmente o volume de financiamentos e permitindo a recuperação de alguns setores de ponta. Há iniciativas visando estimular as exportações -como a criação da seguradora de exportações, pelo Banco do Brasil, e as novas linhas de financiamento do BNDES. Mas é pouco.
Para o próximo ano, é provável que a política monetária seja relativamente afrouxada, para obter-se melhor desempenho da economia, em um ano eleitoral.
Mas, aí, será a vez dos indicadores macroeconômicos se deteriorarem novamente. Com mais atividade econômica, reduzem-se os excedentes para exportação -podendo segurar o crescimento das exportações de manufaturados. Com mais investimentos públicos, poderá retomar a tendência de crescimento do déficit interno.
O país ficará entre a cruz e a caldeirinha enquanto não conseguir resolver definitivamente o nó externo. E cortar esse nó depende em grande parte de uma política agressiva de estímulo às exportações, que ainda não virou meta de governo.
Políticas setoriais empreendidas pelo BNDES conquistaram resultados rápidos. Mas ainda são isoladas.
Absurdo
Uma empresa que fatura US$ 13 milhões anuais entra com uma ação contra o Estado de São Paulo. A Justiça demora 25 anos para julgar a causa. Quando julga, dá ganho à empresa, e, para cálculo de indenização, leva em conta estimativas de lucro que a empresa teria ao longo de 25 anos.
Se a ação tivesse sido julgada em cinco anos, pagar-se-ia o equivalente a cinco anos de lucro. Como levou 25 anos para resolver, o contribuinte que pague pela demora do Judiciário.
Conclusão: o contribuinte paulista será obrigado a pagar US$ 700 milhões, dinheiro que poderia estar em escolas, saúde, e que será utilizado para pagar a demora da Justiça em resolver essa questão.
E como se chegou a esse número extraordinário? Supondo 25 anos de lucros acumulados, capitalizados à taxa de 12% ao ano, o montante da indenização equivaleria a lucros cessantes da empresa da ordem de US$ 4,7 milhões anuais -ou 36% sobre seu faturamento na época.
Não está certo. Preservem-se os direitos individuais, mas sentenças desse tipo não encontram amparo na lógica nem no interesse público. Está na hora de começar a analisar seriamente essa questão das mega-ações contra o erário público e, especialmente, os cálculos de indenização feitos pelos peritos judiciais.

E-mail: lnassif@uol.com.br

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