São Paulo, terça-feira, 23 de setembro de 1997
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"Infinito Circular" vai além do caça-níqueis

PAS
DA REPORTAGEM LOCAL

Algo deve ser dito em favor da volta dos Novos Baianos: "Infinito Circular" não parece um produto caça-níqueis, daqueles feitos sob encomenda para capitalizar prestígio tardio.
É, por outra, trabalho produzido com esmero. Dá para acreditar no que eles dizem, que a pressão de fora para dentro -de fãs e curiosos- culminou no reencontro.
Outra prova do esforço é a metade de material inédito de que o CD duplo se compõe. As novas canções estão, em geral, bem aquém do melhor da produção dos NB, mas demonstram a indisposição do grupo redivivo ao oba-oba.
Nesse bloco, oscila-se da inconsistência ("Anos 70", mais para Doces Bárbaros que Novos Baianos) ao olho no futuro ("Flor de Mandacaru", peça já antológica em que um furioso Moraes Moreira presta tributo à nova música pernambucana).
Enquanto a faixa-título tenta auspiciosa comunicação com o funk carioca dos 70 -coisa que os NB nunca haviam feito-, "A Mídia" faz o mesmo com o alienígena reggae, desfigurando as intenções primeiras do conjunto.
Galvão, antes compositor central da banda, tenta se aventurar no canto-fala. Não funciona, evidentemente -falta o molho maluco que o antes apelidado Joãozinho Trepidação dava ao discurso. Pior, seus poemas recitados quebram a evolução do CD.
Aí se interpõem as regravações -não releituras, pois o bando pretende ser fiel aos arranjos originais. Dão preferência ao repertório de "Acabou Chorare", reproduzido quase integralmente (menos "Swing de Campo Grande").
OK, satisfazem os fãs -mas deixam de lado material mais obscuro (e tão valioso quanto), em geral produzido após a saída de Moraes. E vão mostrando suas caras.
Pepeu, antes só instrumentista, canta "Colégio de Aplicação", única -e essencial- faixa extraída do tropicalista "É Ferro na Boneca!" (70). Mas vai brilhar mesmo no duelo instrumental de "Alimente/ Um Bilhete pra Didi".
Paulinho Boca expõe (quase) recuperada a voz de outrora, que vinha parecendo cansada, e tira de letra "O Ministério do Planeta" (a mais bela canção dos NB) e "Dê Um Rolê" (que Gal gravou em 71).
Baby, por fim, ainda que mais discreta que se poderia esperar, veste seu casaco de pele de pólo centralizador feminino da banda.
Impõe-se como a grande intérprete nova baiana (seguida, de longe, por Paulinho), festejando o puro espírito NB em "Tinindo Trincando", "A Menina Dança" (pobre Marisa Monte, aí se vê que está mais para minipocahontas da MPB, como definiu Baby, que para neo-hippie) ou "Na Cadência do Samba", em que dá uma elza em Elza Soares, sua grande musa.
É isso. Muito havia a temer, mas, protegido por músicos brilhantes, "Infinito Circular" escapa pela tangente de qualquer perigo de vulgarização. Bonito.

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