São Paulo, sexta-feira, 26 de setembro de 1997
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"Na Corda Bamba" transforma deficiente em anjo exterminador

JOSÉ GERALDO COUTO
ESPECIAL PARA A FOLHA

"Na Corda Bamba", escrito, dirigido e protagonizado por Billy Bob Thornton, poderia ser um grande filme, mas sucumbiu aos clichês do cinemão americano. Talvez seja por isso que ganhou o Oscar de melhor roteiro.
O começo é forte e original. Num manicômio judiciário, numa sala iluminada apenas pela luz natural que vaza janelas adentro, um interno falastrão conta suas histórias escabrosas a um companheiro, que ouve em silêncio.
Corta. Duas estudantes de jornalismo ouvem as recomendações do diretor do manicômio antes de entrar para entrevistar o perigoso Karl, que está prestes a ser libertado. O clima é de "O Silêncio dos Inocentes".
Corta de novo. Karl (Billy Bob Thornton), contra toda a expectativa, não é o monstro falastrão, é o outro, o que ouvia calado. Agora é sua vez de falar, para uma das estudantes (a outra ficou de fora).
Ele conta que, por ser retardado, passou a infância recluso numa cabana, até que, aos 12 anos, surpreendeu a mãe na cama com um amante. Matou os dois com uma foice e desde então está no hospício.
Finalmente solto, Karl volta a sua cidadezinha natal, mas tem dificuldade em se adaptar à vida normal. Não que ele seja hostilizado pelas pessoas. De modo pouco crível, quase todo mundo na cidadezinha mostra-se receptivo e disposto a ajudar.
Karl acaba arranjando emprego numa oficina mecânica e faz amizade com um menino da cidade, órfão de pai e tiranizado pelo amante da mãe.
Melodrama
É aí que o filme começa a afrouxar e a cair no melodrama, até por causa do excesso de música melosa.
Na amizade com o garoto Frank (Lucas Black), Karl revela-se um brutamontes de coração de ouro, uma mistura de Frankenstein com Rain Man.
Boas idéias e piadas despontam aqui e ali, e merece louvor a simpatia do filme pelos marginalizados (os personagens secundários mais positivos são um homossexual e uma solitária obesa).
Anjo exterminador
Mas tudo se dilui num sentimentalismo tolo, no clichê quase místico do deficiente mental como uma espécie de iluminado. Há algo de fábula infantil aqui, mas o conteúdo é macabro demais para que se possa recomendá-lo às crianças.
Com um agravante: o drama se desenvolve de modo a justificar a transformação do louco em anjo exterminador que vai punir os maus e redimir os bons.
Se houvesse alguma ironia ou crítica nesse desfecho, o filme poderia ser original e perturbador. Mas não: usa algumas idéias originais para reforçar o velho maniqueísmo, celebrar a velha família, servir ao público a velha catarse.

Filme: Na Corda Bamba
Produção: EUA, 1996
Direção: Billy Bob Thornton
Com: Billy Bob Thornton, Lucas Black
Quando: a partir de hoje, nos cines Metrópole, Belas Artes - sala Carmen Miranda e Studio Alvorada 2

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