São Paulo, sexta-feira, 26 de setembro de 1997
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'Ainda temos muito a oferecer', diz Keith

PAUL SEXTON
DA "INTERNATIONAL FEATURE AGENCY"

Depois de "Voodoo Lounge", os Rollings Stones botaram finalmente o pé de novo na estrada: na última terça-feira, a banda iniciou a turnê mundial "Bridges to Babylon", no estádio Soldier Field, em Chicago.
Até o dia 14 de fevereiro de 98, o grupo levará seu show para o Canadá, Ásia, Oriente Médio, Europa e América Latina -o Brasil, ainda sem data confirmada, deve estar incluído na programação.
Oito dias antes do início de suas apresentações, enquanto ensaiavam em Toronto, Canadá, Mick Jagger, Keith Richards, Charlie Watts e Ron Wood falaram sobre o show, as gravações do novo disco, "Bridges to Babylon", as críticas etc. Leia a seguir trechos da entrevista.
*
Pergunta - Parte do novo álbum foi feito de modo bem diferente daquele no qual vocês trabalharam no passado. Como isso aconteceu?
Mick Jagger - O último álbum de estúdio foi uma espécie de disco bem sólido, de banda trabalhando no estúdio. Fomos todos para Dublin, passamos mais ou menos o tempo todo sentados, juntos, numa sala, e foi um álbum feito de maneira bem simples, antiquada.
Eu achei que, se quiséssemos fazer o álbum de modo diferente, teríamos que adotar uma abordagem um pouco distinta.
Mas não mudamos tudo porque havia muitas coisas que tínhamos que tocar e cantar.
Keith Richards - Enquanto estávamos fazendo esse disco, trabalhávamos ao mesmo tempo em três salas diferentes do estúdio.
A gente passava por Charlie no corredor e dizia: "Não posso parar agora, tenho que fazer uma passagem de som no outro estúdio".
Charlie respondia algo do tipo: "Bem, vou fazer uma percussão no meu estúdio" -era uma coisa maluca. Foi tenso, mas divertido.
Pergunta - Como vocês escolheram as próprias canções?
Jagger - Eu tinha muitas canções que estava escrevendo no outono passado e achei que ia fazer um disco solo.
Eu já tinha muita coisa preparada. Quando Keith e eu nos reunimos, eu toquei algumas delas para ele, e depois disso escrevemos um monte de outras coisas juntos.
Pergunta - Foi bom voltar a gravar numa grande cidade, Los Angeles?
Richards - Fazia anos que gravávamos em lindas ilhas tropicais, mas a verdade é que você fica totalmente por conta própria.
Se você tem uma idéia de incluir um trecho com determinado instrumento ou quer um percussionista extra, esqueça. Foi um enorme prazer não trabalhar num vácuo, em Los Angeles vivem muitos amigos nossos -que passavam pelo estúdio e davam idéias- e foi onde fizemos a maior parte das coisas dos anos 60.
Charlie Watts - Isso afeta a gente, sabe. Por exemplo, nosso amigo Wayne Shorter vive pertinho, e quem também começou a passar pelo estúdio a toda hora é Jim Keltner, e eu passei algumas coisas de percussão para ele, que começou a tocar, e de repente conseguimos que fizesse tudo.
Fora isso, há muitas outras pessoas, muitos músicos, e a gente pode sair e ver outras pessoas tocando. Eu me diverti pra valer, foi maravilhoso porque assisti a algumas coisas de jazz.
Nesta banda, a gente tem o domingo livre, então aos domingos eu saía para ver algumas pessoas tocando.
Pergunta - Parece que o novo álbum dá continuidade ao astral positivo não forçado do álbum "Stripped".
Ron Wood - Fico feliz por você ter mencionado "Stripped", porque acho que é um álbum realmente honesto, realmente bom, que mostrou um pouco do que talvez venha a florescer nesta turnê.
Richards - Os Stones fazem discos melhores sob pressão, quando têm um prazo definido estabelecido. Antigamente nos dávamos ao luxo de levar dois anos para fazer um disco, e nesse tempo às vezes ele já tinha perdido sua força.
O novo álbum tem um certo clima de imediatismo que eu gosto, e, como eu já disse, um clima de seguir adiante, de evoluir.
Nunca antes perdi peso fazendo um disco (ri), mas esse me custou cinco quilos.
Pergunta - As primeiras críticas do álbum têm sido muito positivas...
Jagger - Estou neste ramo há tempo suficiente para saber que às vezes as pessoas dizem coisas ótimas no começo...
Quero dizer, há muitos tipos diferentes de sucesso com um álbum -há seu próprio sentimento de ter dado o melhor de si dentro dos parâmetros que você mesmo se colocou, e depois, se o álbum for bem recebido pela crítica, falta ver se o público gosta.
Eu, pessoalmente, acho que é um álbum bastante bom e que é melhor do que alguns outros que já fizemos.
Pergunta - Durante os ensaios, vocês fizeram uma apresentação secreta num clube em Toronto. Como foi isso?
Jagger - Na verdade, foi bem divertido, foi melhor do que as outras que já fizemos anteriormente, porque às vezes ninguém percebe, mas podem ser desastres totais.
Mas essa foi boa. Agora tenho que transferir a coisa toda e subir num palco maior.
Pergunta - Como vocês criam o roteiro do show?
Jagger - Pensei sobre como o show se divide naturalmente.
A coisa se divide na minha cabeça em seções, como uma peça, então você a decompõe em quatro atos e decompõe cada ato em partes menores, depois eu escolho as músicas que se encaixam naquela idéia do show como um todo.
As músicas são intercambiáveis, você pode começar com uma ou pode começar com outra, desde que seja um certo tipo de música.
Você pode, com certeza, trocar tudo lá dentro, mas só quando já conseguiu determinar o formato do show.
Então eu redigi a lista de músicas que parecia funcionar, e depois disso é preciso tocar a lista do jeito que está.
Mas todo o pessoal da iluminação e os técnicos têm a lista que eu dei a eles e eles vêm trabalhando para fazer a iluminação, e, se acontecer alguma coisa muito fora do esperado, eles me dizem.
Pergunta - Qual é a motivação para continuar com os Rolling Stones?
Jagger - As pessoas sempre questionam isso, é estranho, mas as pessoas vivem nos questionando, querendo saber por que continuamos.
Não sei por quê. As pessoas pensam em suas próprias vidas: "se eu ganhasse rios de dinheiro, eu deixaria de trabalhar". Acho que é assim que elas pensam sobre o nosso trabalho.
Mas, quando se está numa carreira diferente, as coisas não são assim. Não é como ter um emprego normal, porque a gente pára por períodos incrivelmente longos, por um ano, e depois, de repente, faz quatro apresentações por semana e trabalha muito.
Claro que há alguns elementos de um trabalho normal, porque chega a ser bastante repetitivo quando você está sempre ali, no mesmo palco, tocando muitas das mesmas músicas, apesar de modificar um pouco o show.
Richards - Ninguém na banda fala muito nisso nem identifica o que seja. Acho que é em parte porque é isso que fazemos e, se não o fizéssemos, ficaríamos loucos.
É um pouco a vontade de ver até onde podemos ir -ainda achamos que estamos melhorando e que temos coisas a oferecer.
Não somos os Beach Boys, não somos uma banda nostálgica. É claro que há muita nostalgia depois desses anos todos, mas não dependemos disso.
Nosso maior prazer é fazer novas canções virarem motivo de nostalgia. Ninguém quer descer desse ônibus, porque ele ainda está andando, e é difícil descer do ônibus quando ele está em movimento... Você poderia se machucar

Tradução Clara Allain

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