São Paulo, sexta-feira, 4 de dezembro de 1998
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O Brasil e suas crianças

LUIZ CAVERSAN

Rio de Janeiro - Não houve como deixar de se contagiar, ontem, pelas imagens mostradas nesta Folha das crianças brincando no mar. Elas já não cabiam em si por causa da primeira viagem de avião, que fizeram sob os auspícios de uma companhia aérea estrangeira, e ali naquela imagem deliravam junto à areia macia e à água transparente da praia da Barra da Tijuca.
Momento raro, aquele: crianças desassistidas e carentes, no entanto felizes, descontraídas, brincando.
Raro porque na maioria das vezes esse tipo de criança aparece na mídia é por causa de desgraça. Cheirando cola, presa em tentativa de assalto, vítima de tiroteio ou simplesmente pedindo esmola a algum figurão do momento (que em geral não dá a esmola). Não que isso seja culpa dos meios de comunicação, mas sim da vida como ela é.
A imagem do menor carente explorado, abandonado à própria sorte e maltratado ainda é a que dá fama ao país no exterior.
Como acontece com relativa frequência, fui procurado recentemente por um jornalista europeu que se estabelecia como correspondente no Rio e precisava de algumas dicas.
De cara ele disse que criança abandonada era um assunto prioritário para seu jornal e que deveria cobrir bem esse tema. Eu disse a ele, infelizmente para nós, que certamente não iria lhe faltar assunto (esta semana fiquei sabendo que ele estivera em São Paulo, de onde mandou uma vasta reportagem sobre o caso das adoções suspeitas de Jundiaí...).
Das crianças mortas na chacina da Candelária aos pequenos carvoeiros do vale do Jequitinhonha, passando pelos vendedores/pedintes das esquinas e pelos garotos transportadores de droga dos morros cariocas, há uma realidade amarga e cruel envolvendo a infância no Brasil.
Nós não sabemos cuidar da infância de nosso cidadão, o que só alonga ainda mais o caminho em direção à cidadania plena. Objetivo que, pelo visto, vamos demorar muitas gerações para alcançar.

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