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"INSÔNIA"
Peça com Le Plat du Jour e Alexandre Roit adota estética trash
Espetáculo é clássico do nonsense e do pop
SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA
O "teatro besteirol" designa montagens de humor
não muito exigentes, que buscam
antes de tudo a cumplicidade com
a platéia por debochar de temas
cotidianos, contando com atores
que não hesitam em assumir a paródia até o mais infame cabotinismo. Se a isso se incorporar temas
escatológicos e uma estética voluntariamente de mau-gosto e
mal-acabada, ganha o mérito duvidoso de ser também "trash",
cult justamente por ser ruim.
Seria correto se referir a "Insônia" como sendo um besteirol
trash? Sem dúvida, a montagem
do Plat du Jour não tem pretensão
intelectual, no mínimo. O cenário
voluntariamente tosco de Luciana Bueno acumula em pouco espaço passagens secretas por falsas
paredes, além de um improvável
relógio de luz/churrasqueira.
O texto de Alexandra Golik, por
sua vez, é uma frenética sucessão
de chavões de melodrama, encorpados com referências a títulos de
filmes B que dão nome às personagens (Baby Jane, o Bebê de Rosemary) e uma trama que remete
à clonagem com o mesmo embasamento científico do desenho
das Meninas Superpoderosas. Petúnia e Begônia são duas meninas
esquisitas que vivem sozinhas em
uma casa em ruínas, abandonadas pelos pais que mal conhecem
e que talvez tenham matado. Alimentam-se dos raros visitantes.
Qual será o mistério de sua existência? A resposta não tem a menor importância, mas a ágil sucessão de cenas mantém o suspense
das revelações, por mais improváveis que sejam, não raro com
repetições de marcas de um rigor
beckettiano. Se as atrizes às vezes
não resistem em comentar com
caretas as piores piadas (a referência ao "laboratório do Franjinha" por exemplo), não deixam
nunca o deboche virar desleixe.
É essa toda a diferença com o
besteirol. Se o público é induzido
a uma regressão a um humor impúbere, nunca o é por condescendência. A sólida formação de Carla Candiotto e Alexandra Golik,
que formaram o Plat du Jour na
França, estudando as últimas técnicas do teatro físico, impõe respeito pela precisão de marcas e o
ritmo impecável das piadas.
Não há espaço para cacos auto-indulgentes, como é praxe no besteirol. É só ver os primeiros minutos da peça, quase um teatro-dança, quando as duas gêmeas acompanham com os olhos as goteiras
no casarão. Carla, com seus enormes olhos azuis, chega a ser expressionista, e a mobilidade facial
de Alexandra às vezes assusta.
A essa dupla afinada se junta
agora a versatilidade de Alexandre Roit, que sai dos Parlapatões
com o mesmo apetite com que
George Harrison saiu dos Beatles,
para usar uma referência pop. Faz
sete personagens sucessivos, cada
qual com sua característica de
postura e voz, e assim remete a
montagem a um antecedente
mais ilustre: estamos no universo
nonsense de "Irma Vap", com a
mesma vitalidade técnica.
"Insônia" é uma paródia descompromissada, contando com a
cumplicidade da platéia para as
piadas mais infames, mas nunca
com sua condescendência. Um
clássico pop.
Insônia
Texto: Alexandra Golik
Direção e interpretação: grupo Le Plat
du Jour e Alexandre Roit
Onde: TBC - sala Arte (r. Major Diogo,
315, tel. 3115-4622).
Quando: sex. e sáb.: 21h30; dom.:
20h30. Até 14/7.
Quanto: R$ 15
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