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Crítica/"A Fronteira da Alvorada"
Garrel capta flutuações da experiência amorosa
CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA
O cinema do francês Philippe Garrel é daqueles
sem meio-termo: ou se
ama ou se odeia. Ambos extremos se verificaram nas reações
do público a seu filme anterior,
"Amantes Constantes". O título programado para esta Mostra, "A Fronteira da Alvorada",
deve, novamente, provocar respostas discordantes.
Como no longa anterior, Garrel dirige o filho, Louis ("Em
Paris" e "Canções de Amor"), às
voltas com o poder dos sentimentos. Em torno dele gravitam a carnal Carole (Laura
Smet) e a angelical Ève (Clémentine Poidatz), submetendo
sua capacidade de se relacionar
a limites dos quais o jovem fotógrafo buscará escapar.
O argumento, de crônica
amorosa quase banal, é, no entanto, perfeito para Garrel redimensionar o significado do que
pode o cinema. Como na literatura, o sentimento amoroso é
uma constante de sua obra na
medida em que oferece um vasto corpo de experimentações
físicas e emocionais.
As flutuações da experiência
amorosa são registradas por
Garrel de um modo microscópico, no qual os movimentos de
atração e reação ganham uma
representação que ultrapassa o
anedotário amoroso, daí a impressão de rarefação dramática
em seus filmes, do qual parte do
público reclama "porque não
acontece nada".
O que acontece de fato e que
Garrel captura é o imperceptível da experiência, o mínimo
movimento ou a quase ausência dele. Para isso, seu cinema
se arma do recurso inevitável
da contemplação, para a qual o
tempo se torna o principal aliado. Mesmo com uma duração
menor que as três horas de
"Amantes Constantes", "A
Fronteira da Alvorada" não nos
expõe menos à dilatação da
temporalidade, exigindo do espectador um esforço contemplativo fora dos padrões.
A contrapartida sensorial
dessa experiência é dada pela
imagem na fotografia em preto-e-branco de William Lubtchansky, que retoma a saturação da luz nos brancos e nos dá
a ver uma infinidade de cinzas,
numa espécie de expressionismo romântico que já concentrava a beleza mais evidente de
"Amantes Constantes".
O retorno aos fantasmas do
romantismo assume-se como
definitivo quando Garrel oferece o trânsito entre dois mundos, o dos mortos e o dos vivos,
assegurado pelo mito imortal
da paixão. A ele, parte da platéia
responderá com escárnio. A outra vibrará ao testemunhar o
reencontro inevitável do moderno com o clássico.
A FRONTEIRA DA ALVORADA
Direção: Philippe Garrel
Quando: hoje, às 22h, no Cinesesc; dia
25, às 21h50, no Reserva Cultural; dia
26, às 14h20, no Cine Bombril; dia 28,
às 14h30, no Reserva Cultural
Classificação: não indicado a menores
de 14 anos
Avaliação: ótimo
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