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São Paulo, domingo, 24 de agosto de 2003

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"Vida marginal" criada por Mário Bortolotto ganha encenação de Raul Cortez

Beat da sarjeta

MARCELO RUBENS PAIVA
ARTICULISTA DA FOLHA

Em cartaz com duas peças em São Paulo, "Kerouac" e "Homens, Santos e Desertores", e uma no Rio, "Brutal", e lançando em setembro seu segundo romance, "Bagana na Chuva", Mário Bortolotto, 40, na estrada há 20, surpreende:
Um texto seu de 1984, "À Meia-Noite um Solo de Sax na Minha Cabeça", será montado neste ano pelos atores Raul Cortez e Mário Cesar Camargo, com direção de Fauzi Arap. Cortez ainda produzirá outra peça sua, "Fica Frio".
Após assistir à Mostra de Dramaturgia Contemporânea do Sesi em 2002, Cortez apaixonou-se por Bortolotto, viu suas peças no Centro Cultural São Paulo, leu quase toda a sua obra e define: "Ele é uma mistura de Nelson Rodrigues com Plínio Marcos, mas é ele, na sua loucura, com sua personalidade forte. Ele é um oásis. Tive atração pela vida marginal e rica de seus personagens".
Cortez se identifica com a atmosfera da extensa obra de Bortolotto (mais de 40 peças), autor que afirma que escreve como quem "chuta um balde para o abismo mais próximo".
"Ele já é conhecido, mas precisava de um ator que o colocasse nos refletores, porque ele tem muito o que dizer, mexe com as pessoas. E a atuação dele mexe muito comigo", completa.
Autor, ator, iluminador, sonoplasta e diretor, Bortolotto tem a vida com que muitos colegas da classe teatral sonham. Já foi indicado como ator para o Prêmio Shell, que ganhou como autor ("Nossa Vida Não Vale um Chevrolet").
Tem seu próprio teatro (Espaço Cemitério de Automóveis), trabalha com a mesma equipe de amigos, como o bilheteiro Bactéria; atua em seus próprios textos e é produzido, dirigido e iluminado eventualmente por sua mulher, a atriz Fernanda d'Umbra.
Em São Paulo, terça e quarta, atua em seu próprio texto, "Homens, Santos e Desertores", com Gabriel Pinheiro. De sexta a domingo, protagoniza "Kerouac", monólogo de Maurício Arruda Mendonça, dirigido por Arap.
Avesso a restaurantes da classe teatral, o paranaense e ex-seminarista, filho de um motorista de caminhão, começou a escrever nos anos 80 a pedido de seu grupo de teatro de Londrina, que achava "caretas" os textos em disposição. Rato de festivais, ele repete, emprestando a fala de seu personagem Kerouac: "A sabedoria está no excesso".
Numa mostra sua no Centro Cultural, produzida por sua mulher em 2002, trabalharam 79 atores. Ele já trabalhou com os grupos Tapa, Folias d'Arte, Parlapatões, mas nunca teve um texto seu montado por um ator do peso de Cortez. Coincidentemente, o texto "Kerouac" induz que o pai da literatura beat detestava a fama, sentia falta do anonimato e desprezava seus fãs. Bortolotto corre o mesmo risco?
"Não vai acontecer comigo, porque não vou ficar famoso. Eu nunca pensei muito nisso. É que eu não busco esse tipo de projeção, esse negócio de ser famoso e, sendo assim, não consigo me imaginar assim. Eu sou apenas um escritor e ator de teatro."
Começou a escrever na adolescência, após ser expulso do seminário (Coligação Oblatos de São José), por exercer má influência, segundo os padres. Veio para São Paulo em 96 e tentou fazer um curso de ator, mas largou: "Sou um ator "cool". A maioria desses cursos é picaretagem. Aprendo observando as personagens da noite. O Fauzi, que, para mim, é o melhor diretor de ator do Brasil, me faz ser mais visceral".
"Solo de Sax na Minha Cabeça" é sobre dois amigos que nasceram no mesmo berçário, um rico e um pobre, que continuam amigos, apesar das diferenças. "É um tributo à amizade", define.
"Bagana na Chuva" é uma história de amor que se passa em Londrina e será publicado pela editora Ciência do Acidente.
Bortolotto também estréia no Rio em setembro "Curta-Passagem" e "Felizes para Sempre". Mês que vem, reestréia em São Paulo "Hotel Lancaster" (indicado para o Shell) no Espaço dos Satyros, com Angela Dip.


KEROUAC. Onde: Centro Cultural São Paulo (r. Vergueiro, 1.000, Liberdade, tel. 3277-3611). Quando: sex. e sáb., às 21h; dom., às 20h. Quanto: R$ 12. Até 31/8.


HOMENS, SANTOS E DESERTORES. Onde: Espaço Cemitério de Automóveis (r. Conselheiro Ramalho, 673, Bela Vista, tel. 3285-2850). Quando: ter. e qua., às 21h30. Quanto: R$ 5. Até 27/8.


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