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TEATRO
Luis Melo protagoniza "Daqui a Duzentos Anos", encenação de Márcio Abreu com três histórias curtas do autor russo
Contos de Tchecov ganham centro de arena
VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
"Vou, sento, fecho os olhos e fico pensando se os que virão depois de nós, daqui a cem ou 200
anos, e para quem estamos abrindo caminho, vão se lembrar de
nós com uma única palavra de
gratidão."
Eis o trecho de uma carta do escritor russo Anton Tchecov
(1860-1904) contada pelo ator
Luís Melo ao final de "Daqui a
Duzentos Anos". No espetáculo, o
espectador senta, abre os olhos e
escuta vozes do século 19 desejosas de tocar feito um aperto de
mão. Com absoluta devoção à palavra e seus silêncios, a montagem
do grupo curitibano Ateliê de
Criação Teatral, o Act, chega a São
Paulo após passar pelo Rio, para
temporada no Sesc Belenzinho.
"O exercício da escuta tornou-se muito difícil hoje em dia", diz
Luis Melo, 47. Na encenação de
Márcio Abreu, a transposição de
três contos de Tchecov se dá numa arena, espaço que costuma ser
mais exigente na relação público-ator. Ao centro, um tablado de
cinco metros de diâmetro é ocupado pelos atores Melo, André
Coelho e Janja, além da musicista
Edith de Camargo (do grupo
Wandula).
Eles trazem à luz narradores e
personagens criados por Tchecov, consagrado por peças como
"As Três Irmãs" e "A Gaivota".
O primeiro conto, "O Amor", é
o mais bem-humorado, por assim
dizer. Sujeito apaixonado pela
noiva sente-se oprimido pelas
exigências da preparação do casamento. Passa a cerimônia e vem
nova frustração, agora pela rotina
da vida de casado, embora sustente que o amor sobrevive a tudo.
Em "O Caso do Champanhe", o
chefe de uma pequena estação de
trem nas estepes divaga em torno
da vida monótona que leva com a
mulher. É apaixonado ao ponto
da explosão, o que contrasta com
o lugar onde vivem. A mesmice é
perturbada pela chegada de uma
visita inesperada.
Na última história curta, "Brincadeira", surge um Tchecov talvez
mais lírico. Um homem recorda
uma história de amor de juventude. Especialmente a passagem em
que desce de trenó uma montanha de gelo, junto com uma jovem. Seduzida, ela confundia sua
voz com a do vento ao ouvir as palavras "eu te amo".
Os atores buscam ancorar o
olho no olho, a fala ao pé do ouvido do universo dos contadores de
histórias (que não são atores, mas
envolvem tanto quanto eles com
suas "partituras").
Segundo Melo, os textos não-dramáticos de Tchecov constituem um exercício de observação
para o ator que também persegue
a não-representação.
"A intenção é dar liberdade para
que a imagem surja para o espectador", diz Melo.
Com a trilogia de contos tchecovianos sobre os vícios e as virtudes do amor, o diretor Márcio
Abreu, 34, afirma ter aprofundado seu conhecimento sobre a obra
do autor russo.
"Quem vem ao espetáculo esperando um Tchecov sedimentado,
não vai encontrá-lo. Não há aqueles clichês atribuídos à sua dramaturgia "excessiva, melancólica, de
discurso pessimista, que dilata
equivocadamente o tempo" etc.
Isso faz com que a gente perceba o
quanto ele é mal interpretado,
mal lido. Sua obra é tridimensional", diz Abreu.
Daqui a Duzentos Anos
Quando: estréia hoje, às 19h; sáb. e
dom., às 19h; até 11/12
Onde: Sesc Belenzinho - galpão 1 (av.
Álvaro Ramos, 915, tel. 6602-3700)
Quanto: R$ 15
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