São Paulo, quinta-feira, 01 de abril de 2004

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Ministério Público teme que governo use gravação de Santoro para aprovar limite à ação de procuradores; Corrêa diz que caso é "muito grave"

Lei da Mordaça ganha força com nova fita

SILVANA DE FREITAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A conduta do subprocurador-geral da República José Roberto Santoro no depoimento que tomou do empresário do jogo Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, vai servir de munição para aqueles que defendem a limitação dos poderes do Ministério Público Federal.
O governo Lula já vinha dando sinais de que queria aprovar medidas para conter supostos excessos de procuradores e promotores. O principal defensor delas no Palácio do Planalto é o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu.
O Ministério Público teme que o governo explore o caso de Santoro para aprovar na reforma do Judiciário uma norma que dê poder ao Conselho Nacional do Ministério Público (o órgão de controle externo) para demitir promotores e procuradores, independentemente de decisão judicial.
Outro receio é que a chamada Lei da Mordaça retorne à agenda política. Esse projeto só depende da aprovação do Senado para entrar em vigor. Se aprovada, ela proibirá juízes, membros do Ministério Público e autoridades policiais de dar informações sobre investigações em andamento.
Os promotores e procuradores também receiam que o STF (Supremo Tribunal Federal), em julgamento que está para ser realizado, lhes negue competência para abrir investigações criminais e para tomar medidas nessas apurações por conta própria.
Relator do inquérito em que essa questão está sob exame, o ministro Marco Aurélio de Mello comentou: "Esse episódio [depoimento de Cachoeira a Santoro] só vem confirmar a impropriedade da iniciativa do Ministério Público na investigação criminal".
Para o presidente do STF, ministro Maurício Corrêa, a conduta do subprocurador no depoimento de Cachoeira foi "muito grave".
"Traduz, sem dúvida, a conotação política [de Santoro na apuração do caso Waldomiro]. O Ministério Público não pode estar a serviço de perseguições políticas, de vinganças, de vinditas contra quem quer que seja", disse.
Apesar disso, negou que a suspeita sobre a conduta de Santoro possa reforçar os argumentos dos defensores do controle externo do Judiciário e do Ministério Público e da Lei da Mordaça.
Outros três ministros do STF -Marco Aurélio de Mello, Carlos Ayres Britto e Sepúlveda Pertence- saíram em defesa do Ministério Público. Para eles, assim como para Maurício Corrêa, trata-se de um fato isolado.

Advogados
Advogados ouvidos pela Folha condenaram a forma usada pelo subprocurador para tentar obter de Cachoeira uma cópia do vídeo que deflagrou o escândalo Waldomiro Diniz.
O jurista Ives Gandra Martins diz não ver problema em Santoro ter feito um trabalho sem o conhecimento do procurador-geral da República, porque os procuradores têm autonomia. No entanto, acredita que o fato de a conversa ter acontecido de madrugada é "algo abusivo, próximo à fronteira da ilegalidade".
Para Wladimir Reale, especialista em Adins (ações diretas de inconstitucionalidade), a atitude foi "absolutamente ilegal e inconstitucional".
"A prova que ele quer produzir nessa investigação paralela acaba sendo ilícita, sem valor legal. É um tragédia para o caso. Só beneficia o infrator", afirma.
Ele, porém, acredita que o subprocurador não será punido. Ele cita a Lei Orgânica do Ministério Público Federal, que determina as investigações internas. "Há três longas fases. É para que não se chegue a lugar nenhum", afirma.


Colaborou RICARDO WESTIN, da Reportagem Local


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