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São Paulo, domingo, 01 de junho de 2003

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Migração para a base governista predomina no primeiro ano, mas tende a refluir no terceiro

Mudança de partido acompanha eleição para o Executivo

DA REDAÇÃO

As mudanças de partido não são aleatórias, mas seguem um padrão definido pelo ciclo eleitoral. Como explica o cientista político Carlos Ranulfo Melo, 46, as migrações na Câmara se concentram no primeiro e no terceiro ano de cada legislatura.
"No primeiro ano, o deputado se adapta ao resultado do ciclo eleitoral passado; no terceiro, ele procura se ajustar ao ciclo eleitoral seguinte", observa Ranulfo, que é professor titular de ciência política da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).
No início do mandato, o parlamentar tenta se reacomodar às mudanças nos Executivos federal e estadual, procurando partidos que possam oferecer mais recursos. No terceiro ano, o deputado procura a legenda mais propícia para conseguir sua reeleição.
Um estudo de Ranulfo ("Migração partidária, estratégias de sobrevivência e governismo na Câmara dos Deputados", que será publicado no livro "O sistema partidário na consolidação da democracia brasileira", do Instituto Teotônio Vilela), revela que, na legislatura 1995-1999, 40,1% das trocas ocorreram no primeiro ano e outras 43,0% no terceiro; já na legislatura 1999-2003, 45,3% das trocas se deram no primeiro ano, e 40,0%, no terceiro.
No primeiro ano da legislatura, a migração partidária é predominantemente governista; no terceiro ano, nem sempre. No segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, a maioria das trocas ocorridas durante todo o ano de 1999 teve uma direção governista em 70% dos casos. Já em 2001, 61% das mudanças ocorreram no sentido contrário: a impopularidade do governo e a expectativa de derrota da coalizão tucana levaram os deputados a procurar abrigo na oposição.
Um ciclo semelhante ocorreu no governo de José Sarney (85-90), no qual a tendência governista cedeu lugar, no final da gestão, a uma migração oposicionista.
Para o cientista político André Marenco dos Santos, 40, da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), o que singulariza a atual movimentação é o comportamento do PT, "mais impermeável ao ingresso de novos deputados", que produziu um fenômeno distinto do verificado nos governos anteriores: o partido que mais recebeu adesões não foi o líder da coalizão, mas as siglas aliadas -no caso, PTB e PL.
"Quem mais perdeu foram os partidos de oposição, quem ganhou foram os partidos governistas. Mas esse movimento terminou beneficiando outros partidos conservadores", diz Marenco.
O deslocamento da oposição para o governo está balizado, portanto, por um outro padrão: como observa a cientista política Argelina Figueiredo, 55, professora da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), a grande maioria das trocas ocorre entre partidos que ocupam a mesma posição no espectro político.
Na realidade, a transferência se dá sobretudo de um partido conservador (não-governista) para outro partido conservador (alinhado ao governo): a migração entre legendas de esquerda é bem menos frequente, assim como a mudança de um parlamentar de um bloco ideológico para outro.
"Mudou a natureza da coalizão governista, que é bem mais fragmentada que a de FHC e muito mais heterogênea do ponto de vista ideológico", diz Argelina: "A nova coalizão criou uma área de absorção maior, que incentivou um maior número de migrações".
Além de obedeceram a esse balizamento ideológico, as trocas também variam com a densidade política do deputado. Migram principalmente os congressistas que que não ocupam cargos no Legislativo (na Mesa Diretora ou nas comissões da Câmara) ou no Executivo, como nota Ranulfo.
O cientista político assinala ainda que o atual padrão de migração não existiu sempre, mas surgiu com a desagregação do regime militar. Em 1985, uma onda de deputados trocou o PDS, derrotado no pleito presidencial, pelo PFL. Na legislatura seguinte, a cisão do PMDB provocou uma segunda leva de transferências. É só a partir de 1991 que começa a se delinear um padrão de mudanças ajustado ao ciclo eleitoral, que se consolidou na era FHC.



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